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sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Ô, ô, ô, Aurora

Ô, ô, ô, Aurora





Você está perto do palco, pulando, rodopiando, embalado pelo ritmo frenético do frevo Vassourinha. Você pensou: "não é a Banda Spock Frevo, mas, tudo bem. Precisamos dar valor a prata da casa". Mas, você está chateado, pois a banda pernambucana tocou no Pré-Fabi, afogada pelo caudaloso rio do axé, trepada nas costas de um caranguejo morto e eletrificado. Mas, nessa festa tudo pode acontecer. É uma festa das elites e o dinheiro da Loba, com suas tetas generosas, corre solto, tal qual os corruptos "da nossa Pátria tão distraída", dormindo em berços esplendidos. Coitada da bichinha: nunca percebeu "que era subtraída, em numerosas transações".

Você gosta de pular no meio do povão, pois acha que isso é Carnaval, a festa da inversão, da sátira alegre, do humor descontraído, sem as cordas excludentes, e, por conseguinte, sem violências e estiletes cortantes. Até a Policia se comporta com respeito necessário que os foliões merecem. Mas, você está preocupado com a possibilidade de alguma garota aparecer fantasiada de Rita Lee. Nunca se sabe. Não importa o cheiro da erva, porque tudo é alegria e os policiais estão com as expressões "numa boa" e Marijuana, Loura Suada, Maria Pinga são garotas muito apreciadas nas festas de Momo.

"Eh, eh, eh, eh, índio quer apito se não der pau vai comer..."

Você sabe que "ala dos barões famintos, bloco dos napoleões retintos
e os pigmeus do bulevar" não gostam de "colar esquisito", pois "índio quer presente mais bonito". Indio não quer corda, nem camarote: "índio quer apito". Embora não seja um deles, você se contagia com a "indagem", sente-se em harmonia com o povo e chega até acreditar na comunhão cristã. Mas você está triste, nesse momento. Onde se encontra a juventude esclarecida, protestante, com suas roupas simples e alarmantes, seus cabelos de revolta pura e seus livros sobre o negro, a exclusão e a sociedade? Você percebe que eles escrevem, falam, fazem música sobre o povo, mas não se misturam com ele. Talvez isso explique porque esses garotos adoram desfilar nos blocos fechados do Pré-Fabi, todos uniformizados, com uma mão balançando o abadá e com a outra, acenando para as câmeras e para os pais nos camarotes.

Eles compõem o grupo chamado de juventude contida, masterizada, consumista, com rostos alternativos "vá se fuder" e "mamãe eu quero". Eles são do círculo paz e amor, não "com os dedos em V, cabelos ao vento e gente jovem reunida", mas cantando "O meu carnaval é em salvador, tem beijo na bôca aqui impera o amor" do chicleteiro Mel e de tantas outras, igualadas pela mediocridade. Eles sabem que no carnaval paz e amor do axé ou no Pré-Fabi, não podem se misturar com o povo na poeira dos trios, na rabada dos blocos, pois "índio quer presente mais bonito... e se não der, pau vai comer". E agora vai comer mesmo! Como a musa do axé, Ivete Sangalo, resolveu aconselhar a todos os pedófilos jantarem com muita gula as garotinhas, as meninas petistas vermelhinhas que se cuidem e tomem cuidado, principalmente nos camarotes, lugares infestados de lobos maus.

"Mamãe eu quero, mamãe eu quero... Mamãe eu quero mamar..."

Você gostou quando a excelente orquestra, Los Guaranis, tocou essa marchinha e a menina que mamava uma imitação de pênis acoplada em uma lata de cerveja, também gostou. O povão adorou, agitando-se com muita alegria, pois, afinal, mamar é o primeiro ato prazeiroso da nossa existência. No entanto, existe mamadas e mamatas. O povão aprecia as inúmeras variações da primeira opção, mesmo porque a segunda está fora do seu alcance. Verdade seja dita: duvido que você tenha visto algum apreciador da segunda opção, dançando no meio do povo. Tal impossibilidade se dá em virtude dessas pessoas serem apaixonadas pelo povo somente no momento de pedir o voto, e mesmo assim, mantendo uma distancia respeitosa. Você está pensando em sugerir ao vereador Robson Viana que construa camarotes no Rasgadinho e dessa forma, quem sabe, o Sr. Prefeito poderia se fazer presente, como usualmente acontece no Pré-Fabi. Dessa forma, você poderia gritar com toda força dos seus pulmões cachimbados:

"Hoje vou sambar na rua/ você vai de galeria/ quero que você assista/ na mais fina companhia/ Se você sentir saudade/ por favor não dê na pista/ bata palma com vontade/ faz de conta que é turista"

Sei que você está triste pela ausência do antigo aliado das lutas pelo socialismo, o camarada Edvaldo Nogueira, na época um jovem simples, de sorriso franco que rejeitou o passado cultural alagoano da peixeira e do trabuco, trocando-o pelas palavras concientizadoras. Mas o passado é difícil morrer, pois muitas vezes mata-se o Príncipe, mas deixa-se intacto o princípio. Mas é Carnaval, e nesse momento você saúda algumas pessoas que passam formando um trenzinho. Você não sabe que são, que fazem, como vivem, mas não importa. Nesse instante, são pessoas iguais a você, unidas pela música, cadenciadas pelo ritmo, como deveria ser, como você sempre sonhou o socialismo. O cantor da banda cantarola:

"Meu coração é vermelho (Hei, Hei)/ De vermelho vive o coração (Ê, ô, ê, ô)/ Tudo é garantido após a rosa avermelhar/ Tudo é garantido após o sol vermelhecer"

Você sente uma pontada de tristeza. Já vai amanhecer e com a noite se vai a alegria igual.

Você pensa: o amanhecer também pode ser vermelho.

A banda lança os últimos acordes:

"Se você fosse sincera, ô, ô, ô, Aurora/ veja só que bom que era, ô, ô, ô, Aurora"


Ivan Bezerra de Sant Anna




Publicado no site http://ibezerra.xpg.com.br e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/






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