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terça-feira, 3 de julho de 2012

Os novos censores I

Os novos censores I



“Excepciona-se da proteção à pessoa dotada de notoriedade e desde que no exercício de sua atividade, podendo ocorrer a revelação de fatos de interesse público, independentemente de sua anuência. Entende-se que, nesse caso, existe redução espontânea dos limites da privacidade (como ocorre com os políticos, atletas, artistas e outros que se mantêm em contato com o público com maior intensidade)... BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p.108.

“Um julgamento não é um comércio livre de idéias e nem constitui o melhor teste da verdade num tribunal o poder de pensar que se será aceito no mercado..."
juiz Frankfurter





Existe uma censura terrível, insidiosa, subterrânea que se infiltra capilarmente nas fundações estruturais da sociedade, causando graves e irreparáveis danos à Democracia. Por mais terrível que seja a censura em um regime político autoritário, no entanto, ele é visível, concentrado, locado em áreas formais das instancias do Poder e por mais que as elites queiram disfarçar e maquiar é impossível não diferençar o que são os órgãos institucionais do Estado autoritário, daqueles outros estabelecidos na Sociedade Civil, núcleos plurais de resistências ao autoritarismo.

Engraçado é que o imponente e arbitrário Judiciário de agora, em um passado não muito distante era muito parecido com uma fazenda de ovelhas comandada pelas espadas militares. Preciso relembrar que Olga Benário foi extraditada para Alemanha nazista com a permissão do STF? Ou que sofrendo pressões dos militares a Corte Suprema colocou na ilegalidade o Partido Comunista Brasileiro? Que milhares de pessoas foram presas e torturadas durante a ditadura militar de 1964, enquanto o Judiciário estabelecia um cômodo silencio dos omissos? Os direitos fundamentais e seus diversos princípios que hoje o judiciário usurpador evoca não eram naturais e essenciais à condição humana e porque não foram aplicados nas épocas dos regimes autoritários? Se as normas pragmáticas e princípios abstratos são sacados indiscriminadamente para censurar o legislador na atualidade, não entendo porque não foram usados nas épocas ditatoriais. Será que a razão Juridica dos nossos juízes é pragmática e circunstancial? Ou essa história que o Poder Judiciário é o guardião da Democracia é uma farsa bem montada pelo sistema jurídico norte-americano? Se formos folhear as páginas da História verificaremos que o judiciário sempre existiu nos regimes autoritários e que a Democracia é decorrência das lutas populares, dos políticos renovadores e jamais foi oriunda de sentenças judiciais.

É com muito pesar que percebo que o Poder Judiciário no Brasil em vez de cumprir a sua honorável e grandiosa missão de Árbitro da democracia, infelizmente, tornou-se seu algoz. Vaidades, ambições políticas, corrupção conciliada com as elites são, dentre outros, elementos explicativos para essa atual situação. A sempre frágil Democracia brasileira constantemente alvejada por grupos conservadores e pela ação de políticos irresponsáveis, depara-se com um inimigo poderoso e eficiente: o Poder Judiciário. Silenciosamente e de forma sorrateira, os integrantes desse Poder meramente formal ocupam o espaço do legislador sob a rota desculpa da omissão legislativa ou da violação de princípios abstratos e indefinidos. O que mais preocupa é que não faltam juristas que aplaudam essas ações, todos eles imbuídos de um platonismo visceral, mas contraditoriamente, hasteando a bandeira socializante. Muitos se dizem dialéticos, porém desconhecem Heráclito, Hegel e Marx e principalmente a premissa maior da filosofia dialética que afirma que as mudanças do mundo se efetivam pela ações conscientes dos homens agregados em grupos políticos.

Em todos os países verdadeiramente democráticos, o Poder Judiciário existe para oferecer aos cidadãos uma jurisdição contenciosa para dirimir conflitos e não para atuar como jurisdição administrativa. Em nosso modelo peculiar de Democracia, em meio às esdrúxulas jurisdições voluntárias e administrativa, existe a jurisdição administrativa eleitoral com inúmeras funções extravagantes, dentre elas, o controle censor do processo eleitoral. Uma verdadeira violação à Democracia! Um juiz eleitoral se entender que um candidato ofendeu ao outro, pode punir com severidade o pretenso ofensor, retirando-lhe o direito de expor suas criticas aos eleitores. Para que então servem esses debates, se os candidatos não possuem liberdade para denunciar e criticar? Como poderão os eleitores adquirirem esclarecimentos se os juízes manipulam os debates sob critérios subjetivos? Na época da ditadura militar os debates eleitorais foram suprimidos e seu lugar foi ocupado por um desfile de fotos com legendas, sob a desculpa de que as informações para os eleitores tinham que ser de maior objetividade. Atualmente, os juízes censores declaram que o espaço eleitoral deve ser usado para o debate de projetos políticos e não para críticas e ofensas. Que Democracia!

Serão deuses, esses juízes, ou argonautas de um lugar mágico e distante? Pelo que sei são apenas funcionários públicos nomeados por concurso que cumprem uma função de relevância social, não mais relevantes do que os professores e médicos, apesar dos altos salários, acrescidos de auxílios "disso e daquilo". Mas que se julgam um extrato superior, isso é indiscutível. Por exemplo, eles tratam o povo que é a gênese do Poder político como relativamente incapaz, um adolescente meio sem juízo que precisa de proteção e orientação. Desta forma, quem tem o real Poder, o juízes protetores ou os protegidos? Todo poder emana do povo ou dos juízes? O mais interessante é quando se trata de coibir a compra dos votos - uma modalidade de "argumentação" usado nos países pobres e subdesenvolvidos - os nossos poderosos juízes são ineficazes, apesar da população saber quais são os políticos eleitos que usaram e usam esse recurso. No entanto, os nossos juízes tão sapientes nada sabem, apesar de toda interferência administrativa que efetuam. Aliás, eles não sabem de nada, pois basta conversar com algumas pessoas, em algum canto de rua qualquer para ser informado das intrincadas práticas de corrupção e seus autores, todos os detalhes técnicos, entretanto, não vemos nenhum deles na cadeia. Não é o momento de definirmos um novo conceito de gênese de Poder em nosso País? Não seria mais realístico que "todo Poder emana das elites e por ela é exercido, de forma direta ou através dos seus representantes, as instituições administrativas, legislativas e judiciais"?

O que se percebe é o constante cerceamento da liberdade de expressão em nosso País. Não bastassem os filtros do mercado editorial e de divulgação, os juízes exercem uma forte censura sob o argumento da proteção à honra, ao direito de privacidade, fazendo uma imensa confusão entre a personalidade privada e a pública. Uma coisa é a privacidade sobre fatos íntimos, sobre a vida familiar, sobre a reserva no domicílio e na correspondência e outra são as ações de uma pessoa pública que dizem respeito à sociedade. Conforme as lições do ilustre jurista Humberto Nogueira Alcalá, uma informação que afete a honra de uma pessoa será lícita e legítima, quando se refere a fatos de relevância pública que questionam a honradez de uma figura pública ou, de uma pessoa privada envolvida em tema de relevância pública e quando existe um interesse legítimo dos membros da sociedade em discutir assuntos que incidam diretamente naquela sociedade. Um cidadão ou um político que acusa um pessoa pública de ter cometido um ato reprovável não está cometendo nenhum ilícito civil ou penal, pois "em tales casos las personas afectadas se deshonran em virtud de sus propios actos". Humberto Nogueira Alcalá. Problemas Contemporâneos de La Libertad de Expresión. 1ª ed. México: Editorial Porrúa, 2004. p. 161.

As teses sobre matérias da ciência sociais são polêmicas por natureza, pois nunca existe uma comprovação segura sobre os fatos sociais e quando se trata de fatos históricos, diversas interpretações se apresentam abrilhantadas pelo critério da razoabilidade. Assim é imensamente reprovável que um juiz pousando de supercientista declare a inveracidade de uma tese histórica em detrimento de outras, ou mesmo que entenda razoável, proíba sua publicação por motivos de repercussões em honras familiares. Um absurdo! Um verdadeiro atentado às ciências históricas! Uma labareda ardente das novas fogueiras da Inquisição judicial.

Lampião transava com homens? Maria Bonita trepava com os cabras? A suposta filha era mesmo filha do capitão? Ora, essas questões nunca poderão ser respondidas com total objetividade e nem por isso deixam de ser indagações históricas. É razoável supor que um juiz por mais versado que seja na História não poderá responder essas questões com objetividade e nem proibir a divulgação das mesmas.

Uma certa vez perguntaram ao Zé do Mercado qual era a cor mais bonita, se vermelho ou preto. "Seu" Zé com sua proverbial sabedoria, respondeu: "Olha, aprendi na escola primaria que preto não é cor, mas ausência das cores. Mas acho que deve levar esse problema para os juízes, pois eles sabem tudo e se não souberem, inventam. É possível que algum juiz diga que as duas são de igual beleza".


Ivan Bezerra de Sant Anna






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