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sábado, 18 de abril de 2015

Terceirização: verdade e mito

Terceirização: verdade e mito 




Depois de alguns anos dormindo em alguma gaveta no Congresso Nacional, a população brasileira foi supreendida com a notícia que o projeto lei nº. 4.330 que disciplina o processo de terceirização, tinha sido aprovado pela Câmara de Deputados, inclusive com votos da bancada petista. Se é compreensível que a bancada empresarial, aproveitando-se da fragilidade da Presidente da República, percebeu que era o momento propício para aprovar o referido projeto, não ficou muito claro, entretanto, a participação da maioria da bancada petista nesse episódio. Não porque os ilustres deputados petistas sejam rígidos socialistas, mas porque fizeram de maneira fugidia, à revelia das centrais sindicais.  Aliás, a orientação ideológica que guia o lulismo, não passa de um aglomerado de ideias neoliberais, adoçado por um populismo clientelista, tão a gosto do nosso capitalismo tupiniquim. Quando foi Presidente, o Sr. Lula foi flagrado várias vezes usando o termo "empregalidade", palavra chave, a pérola preciosa do neoliberalismo, usada para explicar e justificar a mobilidade dos empregos, ficando as velhas promessas petistas de estabilidade relativa, o fim da denúncia vazia, relegadas ao lixo da história.

Ora, se o PT e aliados foram os maiores terceirizadores do setor público (a Petrobras é um bom exemplo), desmobilizou o Ministério do Trabalho na sua função fiscalizadora (nunca mais se ouviu falar em concurso para fiscal do trabalho), não extinguiu a denúncia vazia, os deputados petistas votaram no projeto, por que então essa explosão de indignação da Presidente e sua tropa de choque na net e na grande mídia? Contradições, confusões, conflitos no seio petista? Não! Apenas uma hábil e astuta movimentação estratégica que visou dividir, assustar a "reacionária classe média" (palavras bovinas da profa. Marilena Chauí) com a bandeira da extinção gradual do concurso público. Enquanto os planejadores lulistas jogavam com desenvoltura em um tabuleiro de Xadrez, a Direita tradicional e os empresários gananciosos jogavam acanhados em um tabuleiro de Damas. Quanta incompetência!

Já há algum tempo que os estrategistas lulistas tocavam o monótono acorde, enfatizando o caráter reacionário da "classe média", uma afirmação totalmente pragmática, sem nenhum embasamento histórico e científico, mas que iria ser de grande utilidade para os manipuladores petistas. Eles sempre souberam que os extratos médios sociais brasileiros não eram reacionários, mesmo porque tinham sido a base do petismo de outrora e de onde saíram os seus principais líderes e intelectuais. Sabiam que os extratos médios eram confusos e contraditórios - uma característica sociológica de todos os extratos médios do mundo - e essas características seriam valiosa para os seus propósitos, acrescida pela cultura autoritária que permeia os valores culturais brasileiros, quanto à intolerância aos novos e velhos valores e a divergência de ideias e opiniões. Assim, era só esperar que o bloco carnavalesco das múmias paralíticas do Olavo de Carvalho entrasse na avenida, cortejado pelos homofóbicos, liderados por Bolsonaro; cartazes estupidos pedindo a intervenção militar; corruptos conhecidos vociferando contra a corrupção; e estava montado o palco para a desmobilização política da terrível "classe média". Faltava, porém, mais um lance, e com o estímulo de alguns deputados petistas, a avarenta bancada empresarial e a incompetente oposição, deram: a aprovação furtiva do projeto de lei da terceirização! As pessoas, que até então estavam indignadas com a lama da corrupção petista, perplexas, angustiadas, se perguntavam: "Meu Deus, e os empregos, os concursos públicos, como vai ficar tudo isso?" Nesse momento, coloca-se a pedra chave no tabuleiro: "Mamãe Dilma está com vocês. Ela vai vetar a famigerada lei. A culpa disso tudo é do PSDB e aliados".

A Direita tradicional e a extrema Direita do Sr. Olavo Carvalho precisam aprender o novo jogo do neoliberalismo populista, uma nova orientação de direita que o PT é o seu mais digno representante. Por que esse retrógrado anticomunismo, quando se pode auferir grandes lucros pessoais com empréstimos aos países que têm orientação de Esquerda? Ou será que existe alguém ingênuo, ao ponto de acreditar que Lula não levou a sua gorda comissão desses empréstimos? Enquanto o Sr. Olavo de Carvalho e seus "camisas pardas" chamam Lula e seu bando de comunistas "comedores de criancinhas", os lulistas vestem camisas vermelhas e distribuem bolsas "disso e daquilo", enquanto ajudam as grandes empresas e Bancos, auferindo grandes recompensas financeiras. Os seguidores do Bolsonaro e do Olavo ainda não perceberam que o socialismo em nosso País se encontra nas bibliotecas, sob a guarda de poucos intelectuais resistentes, e essa constatação não é recente, pois, certa vez, Carlos Drummond de Andrade, acometido pela descrença, declarou que a única Esquerda organizada era a Associação dos Canhotos Paulistas. Essa turba vestida de camisas rubras, quando não são torcedores do Sergipe, são apenas uma massa de manobra de salafrários, pilantras e corruptos que em nome de uma pluralidade de demandas, dizem que tudo é relativo, manobrando os conceitos, moldando-os segundo seus interesses, criando polos artificiais para a manipulação maniqueísta, e se existe uma realidade objetiva, essa deve ser negada em nome do pluralismo e substituída por sonhos e atitudes performáticas. O Sr. Olavo de Carvalho, mesmo cercado de tantos livros, não percebeu que no pósmodernismo da era petista, tudo existe e nada existe, tudo que é sólido se desmancha na podridão do ar rarefeito, nada é verdade e tudo é Capital insinuantemente dominante, e somente existe uma verdade: não existe verdade! Imaginem, senhores dogmáticos de um passado tenebroso, que estamos no Brasil - "em uma terra que em se plantando tudo dá", como já disse Pero Vaz de Caminha - e aqui não se aplica o famoso dilema existencial do "to be or not to be", mas a versão esquizofrênica do "to be and not to be", o que o nosso atual filosofo brasileiro, aquele que tem um busto perto da Casa Branca, poderá dizer: "nois é e não é, e o que digo, seremos!" Assim, caro professor, cores e camisas são apenas coisas que servem para enfeitar e enganar, e se deseja ter alguma credibilidade, deixe de jogar damas e vá a um tabuleiro de xadrez.

E o nosso tão discutido projeto legislativo da terceirização? Ora, em um País onde as empresas estão altamente terceirizadas, essa "pressa" dos seus defensores somente é justificada pela ganância em relação aos futuros e rentáveis negócios com as empresas estatais. No entanto, acho que deve haver uma lei que normatize o processo de terceirização, mas de uma forma sorrateira e pretensamente astuta, não seria uma boa solução democrática. O resultado dessa pretensa inteligência estratégica foi trágica: a mamãe Dilma virou salvadora da "classe média" concurseira! Não me canso de repetir: quanta burrice! E como não se espera burrice dos espertos, segundo o saudoso Raimundo Faoro, burrice demais pode esconder a astúcia disfarçada. Coisas de um Brasil macunaímico, a terra onde todos gatos são pardos.

É difícil dar lucidez a um empresário, pois seus objetivos competitivos são a curtíssimo prazo, e como já observou Karl Marx em páginas belíssimas de O Capital, o próprio empresário perde a dimensão do valor de uso, alienando-se nas teias do valor de troca, em obediência ao Deus ex-machine, o Capital que cumpre a sua interminável sina de se reproduzir em ciclos eternos. Em seu individualismo possessivo e competitivo, não percebem que estão destruindo os elementos basilares do capitalismo e, muitas vezes, torna-se necessário o aparecimento de uma grande crise econômica, acompanhada pelo crescimento de uma verdadeira esquerda, para haver reformas que induzam um novo ciclo de crescimento. A era Roosevelt é um exemplo do que afirmamos, tendo o Estado assumido a tarefa de administrar e fazer reformas profundas que debelassem a crise, apesar da ampla resistência do empresariado. 

Atualmente, depois da enorme crise financeira de 2008, constatou-se que a avidez do capital financeiro produziu inúmeras fraudes, com a única finalidade de auferir enormes ganhos, e quando o sistema desabou, foi o dinheiro do contribuinte que irrigou os cofres dessas empresas desonestas e incompetentes. Pergunta-se: onde se encontra a famosa eficácia do Capital? Percebe-se que os grandes capitalistas industriais e manufatureiros vivem com o dinheiro público, enquanto o capital financeiro vive de especulação, fluindo para os lugares que lhe seja propiciado grande rentabilidade. Nesse cenário, a terceirização internacional está destruindo empregos, desmobilizando o parque produtivo dos países industrializados, inclusive nos EUA. Se a terceirização visa tão somente a redução de custo, em consequência da especialização e economia de escala da terceirizada, tudo bem, mas que isso não se traduza na redução de empregos ou na precarização dos ganhos trabalhistas. 

Entretanto, o que se vê é uma enorme avidez por maiores lucros do Capital, precarizando as conquistas trabalhistas e reduzindo as vagas de empregos. Pergunta-se: se continuar o crescente desemprego, a consequente redução da renda disponível para o consumo, quem vai comprar os serviços e produtos das empresas? Será necessário o Estado gerar esses empregos ou bolsas para irrigar a economia, e se essa for a solução, como financiará essas despesas, uma vez que o empresariado é fortemente contra ao aumento de impostos? Claro que a solução do Lulismo jamais vai ser aceita por países de economia avançada, pois baseia-se em um crescimento astronômico da dívida pública (a dívida interna beira já ao R$ 2,4 trilhões!) o que mais dia ou menos dia, a falência pública será declarada.

E o que fazer? Essa velha indagação leninista somente poderá ser respondida em um verdadeira República, com os canais de comunicações democráticos desobstruídos, através de um amplo diálogo que perpasse os interesses mesquinhos, um projeto de desenvolvimento nacional que envolva empresários e trabalhadores, despidos do populismo dos enganadores, que almejam um acordo sempre precário, mas sempre rediscutido e renovado. 

Mas tudo isso é um sonho, um desejo, uma prece. Moramos em uma falsa República, permeada por ambições, mentiras e engodos. Enquanto todas as atenções estavam voltadas para o obscuro PL 4.330, o STF, na surdina da noite, julgava constitucional a lei nº 9.737/98, sancionada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, que autoriza a Administração Publica repassar a gestão das escolas públicas, universidades estatais, hospitais, unidades de saúde, museus, fundações, empresas públicas, para entidades privadas sem fins lucrativos, tais como Ongs e Organizações Sociais. Existe algo mais nocivo para a moralidade pública e para o instituto do concurso público? O mais interessante é que os Ministros considerados fiéis ao lulismo, votaram na constitucionalidade da referida lei, o que é uma constatação realmente estranha. O que a Presidente vai fazer, já que a digna mandatária é contrária à terceirização? E a CUT, como se manifestará? Ou será mais um jogo de cena, uma pérfida manipulação, sendo o PL  4.330 apenas um falso alvo para desviar os olhares da população, enquanto o STF "aprovava" e presenteava o lulismo com um maravilhoso instrumento de aparelhamento e corrupção da Administração Pública?      

Com a palavra, a excelentíssima Presidente da República...

Ivan Bezerra de Sant' Anna



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