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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Pobre Carnaval...

Pobre Carnaval... 



Virou moda em nosso País, a demonização das festividades carnavalescas, transformando-as em um corretivo cautelar para todas as mazelas dos nossos prestimosos administradores. Depois de passarem o ano gastando irresponsavelmente, financiando vaquejadas e festas de Padroeiras, em alguns casos, desviando os recursos públicos para os seus bolsos, exclamam,  para os aplausos dos incautos: "não vamos gastar o dinheiro público nas festas do Momo, pois estamos falidos". Aplausos, aplausos e aplausos! "Que político sensato", dizem as massas, extasiadas pela brisa amena do populismo que esconde com eficácia as causas da penúria administrativa.

Certos ou não, os administradores municipais podem exercer esse processo de escolha pelos critérios de conveniência e oportunidade, elementos conceituais de exclusiva competência do Poder executivo. Creio que na maioria dos casos, essa escolha de não realizar gastos de festas é positivamente correta, excetuando-se os casos em que a desculpa de pagar gastos essenciais é apenas um biombo para esconder as reais intenções, como pagar empreiteiros, por exemplo. Seja de uma forma ou de outra, essa decisão é de exclusiva competência do administrador, não podendo haver interferências externas, mesmo eivadas das melhores intenções e do mais alto sentimento de justiça, pois somente o povo pode julgar o administrador, quando investido das suas funções de escolha política.

Seguindo esse percurso democrático, aplausos para a Juíza Ana Bernadete que cassou uma liminar de um juiz que impôs  restrições à realização do festejo do Rasgadinho. A motivação decisória da juíza é irreparável, bem articulada, e enfatizando o respeito à separação dos poderes, não bem observada pelo apressado magistrado, ansioso para pegar carona nessa populista competição momodestrutiva.

Já a decisão do Presidente do TCE, apesar das suas boas intenções, foi altamente desastrosa, violando o princípio da separação dos poderes. Ora, as administrações municipais estão em dívidas com os servidores da Educação? Tudo bem! Então vamos saber as causas desses terríveis delitos. Os Prefeitos estavam reservando os recursos exigidos pela Constituição para a Educação? Não estavam? Então caberia ao TCE tomar medidas eficazes para apurar responsabilidades, restaurando o fluxo financeiro, com a consequente punição dos culpados. Se haviam desvios de recursos públicos para serviços e obras fantasmas, deveriam os técnicos auditores do TCE ter apontado tais irregularidades, para que fossem sanadas na época em que aconteceram. Fizeram isso? A resposta é óbvia, pois os casos dos desvios dos recursos públicos da merenda escolar é um claro exemplo dessa inatividade do TCE, recheado de técnicos, auditores e conselheiros. Afinal, para que serve o TCE com sua inchada estrutura administrativa? Um Tribunal de "faz de conta", como dizia o Sr. Jackson Barreto? 

Acredito que a indignação do Presidente seja justa, frente a imoral inadimplência dos administradores municipais, no tocante ao pagamento dos salários dos servidores da Educação. No entanto, sua decisão extrapola as suas atribuições constitucionais, subsumindo-se na figura do administrador para realizar opções administrativas. Uma vez que os gastos com a festa carnavalesca estava autorizada no orçamento público, com rubrica própria, e a nossa Constituição Federal não estabelece hierarquia dos pagamentos dos gastos públicos, não poderia o Presidente do TCE ordenar uma preferência subjetiva, por ser essa atribuição de intransferível competência do administrador, e se ao contrário for, a usurpação democrática se faz presente. 

Se não bastassem essas considerações, ainda tem o fato de ser uma decisão monocrática por via cautelar. Um verdadeiro absurdo lógico, pois toda verdadeira cautelar ao tentar preservar um interesse, por outro lado, garante a reversibilidade do outro interesse paralisado, para que o posterior julgamento colegiado não passe de uma mera farsa. Apesar do eufemismo, o Sr. Presidente efetuou um julgamento definitivo da questão - ou será que podemos fazer a festa de Carnaval em outro mês? - subsumindo-se em decisor  colegiado e sentando-se na cadeira do administrador municipal.

Boas intenções não bastam, Sr. Presidente, pois o inferno está cheio de pessoas de boas intenções, e os ditadores sempre percorreram esse caminho, como pais prestimosos que zelam pelo bem-estar dos seus filhotes revoltados. O secular problema desse País é a quase ausência dos valores republicanos, o vivenciamento  de um esquizofrênico conceito democrático, uma crença nefasta  que as demandas populares podem ser atendidas por pessoas esclarecidas de mãos cuidadosas, mas que, às vezes, ostentam o tacape disciplinador. Portanto, um pouco de humildade e cultura democrática não faz mal a ninguém, assim como um bom caldo de galinha. Sabe qual é a suprema ironia dessa história, Sr. Presidente? Se os moradores desses municípios não vão ter "o direito a uma alegria fugaz/ Uma ofegante epidemia que se chamava carnaval", o TCE vive a plena euforia do Carnaval, em um bloco onde palhaços e Reis trocam de papéis

Ivan Bezerra de Sant' Anna


Publicado no site http://www.facebook.com/ibezerra52;  e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/