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quinta-feira, 31 de março de 2016

Lembranças de Abril

Lembranças de Abril


 

As cores de Abril, esse mosaico de uma aquarela difusa como uma pintura abstrata em busca de um autor, são modeladas ao gosto de interesses e ideologias diversas, oscilando vertiginosamente na linha do tempo entre um passado imperfeito, um presente desfeito, um futuro de perfeita névoa. 

Ah, Abril dos sonhos idílicos, dos horrores que persistem, dos amores impossíveis. Abril que nasceram os ditadores Adolf Hitler, Luiz Bonaparte, Getulio Vargas, ou Thomás Jefferson, Leonardo da Vinci, Charles Chaplin, William Shakespeare? Abril da descoberta de uma posse, um Brasil nunca descoberto? Abril dos militares da Revolução Democrática dos Cravos, das legiões infantes comandadas Joaquim da Silva Xavier - o Alferes Tiradentes - ou dos militares reacionários comandados pelo General Castelo Branco?

São muitas recordações e sonhos desfeitos nesse Abril, que em um singular episódio, percebi a perfídia de certos líderes políticos que se aproveitam das lutas populares para pavimentar o torpe caminho dos seus reais interesses. Foi em um Abril lamentável que o Sr. Jackson Barreto pediu a minha devolução da Câmara de Vereadores para a EMURB, empresa que era advogado e tinha sido Chefe da Assessoria Jurídica por alguns anos. Pensei: "mesmo tendo desavenças políticas com o Sr. Prefeito, acho que por um passado de lutas, ele quer minha contribuição técnica". Ledo engano! Ao voltar, percebi que não existia nenhuma mesa para que pudesse realizar meu trabalho, sendo informado pela atual Assessora que iria colocar uma cadeira no corredor para mim. Imaginem essa cena que montaram com requintes de crueldade, visando a minha desmoralização. Protestei, e como prêmio para minha revolta, fui transferido para a garagem da empresa sem direito a uma cadeira! Mas o ódio, a perseguição horrenda ainda não tinha alcançado o sua ribalta grandiosa. Ela chegou acompanhada de um capanga ideológico do Sr. Jackson, alcunhado de Chudo, que foi nomeado Presidente apenas por breves dias, para efetuar a minha demissão e de mais de 35 funcionários que participaram da fundação da Associação Trabalhista da Emurb. 

Ah, as cores de Abril escondem as negritudes de um presente que insiste na mentira enganosa, evitando um mergulho às raízes profundas dos reais problemas do Brasil. Não precisa muito esforço para perceber que o patriarcalismo possessivo e corrupto, o autoritarismo e o populismo são essas chagas perversas que sempre destruíram o tecido social saudável que insistentemente ousa nascer. As únicas revoluções que conhecemos se plasmaram na linguagem e não em uma práxis construtiva. República Nova, Nova República, são mudanças apenas na ordem do adjetivo, mantendo intactas as relações oligárquicas, uma falsa República sem a gloriosa La Marseillaise, "um mudar para que nada mude", como atestava Lampedusa, referindo-se à triste história italiana.

Não importa a "cara de pau" do Sr. Jackson Barreto ao depor perante à Comissão Verdade, fazendo-se de vítima perseguida pela Ditadura Militar, quando se sabe que ele nunca foi preso ou perseguido. Ao contrário, graças ao período negro que foi submetido o País, ele soube muito bem tirar proveito da situação, representando o seu papel favorito: o de Salvador da Pátria. E quantos pilantras se aproveitaram do sofrimento do povo brasileiro, planejando habilidosamente os seus intentos secretos de Poder? Será que ele vai explicar, em nome da verdade, como ficou "bem de vida", quando viu nas poucas árvores das praças aracajuanas, uma floresta amazônica a ser cortada? Ou por quanto se vendeu ao Sr. Albano Franco? Poderia explicar, por exemplo, o que fez com os quinze milhões que recebeu de Lula, duas semanas antes do pleito eleitoral que reelegeu Marcelo Deda, não é verdade? Quem sabe não explique a falência do seu governo, atrasando salários até dos professores da sua aliada Deputada Ana Lúcia? Não, ele nada vai dizer sobre isso, vai apenas fazer cara de choro e denunciar um golpe contra a democracia que, segundo o seu entendimento, é uma simples palavra sem alcance substancial, um vernáculo alicerçado pela compra de votos, pelo aparelhamento dos tribunais superiores e por aliciamentos pecaminosos. Sua lógica é de uma simplicidade aterradora: golpe é tudo aquilo que venha questionar essa quadrilha que está no Poder, mesmo que seu chefe se dê ao desplante de furtar talheres de ouro, baixelas de prata, crucifixo  - coisas que faz um um ladrão de quinta categoria -, pois como diz Zé do Mercado, "quem rouba um santo é capaz de qualquer coisa".

Esses falsos choramingos para uma Comissão Verdade que nasceu para não ser verdadeira, mas para ser usada como um instrumento que assuste aos que vão às ruas buscando a verdadeira democracia. O real objetivo dessa Comissão não é questionar as causas profundas que levaram ao golpe militar de 1964, as raízes que datam da ditadura Vargas que em nada se diferenciou dos militares de 64, igual até o nacionalismo "ame ou deixe-o". Quem mais torturou ou matou comunistas? Garanto que é um disputa dura, pois entre o Sr. Filinto Muller e o Sr. Fleury, a competição é acirrada. E quanto aos civis que planejaram com os militares e o Departamento de Estado dos EUA, ou aqueles que aderiram ao golpe por oportunismo, como foi o caso do Sr. Juscelino, Ulisses Guimarães e tantos outros que viam da deposição do Presidente Jango um fácil caminho para as eleições Presidenciais de 1965? 

Essas coisas não podem ser ditas na Comissão Verdade, pois como se vai explicar toda essa elite que participou da Ditadura militar no Governo Lula? Como se pode entender a participação do Sr. José Alencar na vice-presidência, uma vez que ele e tantos outros empresários, financiava as operações terroristas e paramilitares do Delegado Fleury, chegando ao desplante de assistir às sessões de tortura? Talvez agora esteja explicado porque essa Comissão nasceu tardiamente, depois do governo Lula, quando as ruas questionavam a corrupção, o patrimonialismo feroz dos políticos, insatisfeitas com essa "democracia do dinheiro".

A Democracia, como assim emergiu  na Grécia, nasce e vive nas ruas. Se os acordos normativos são ilusórios e não atendem às demandas populares, a Democracia se retira do palácio das normas e se instala ferozmente nas ruas, onde sonhos idílicos se confrontam com o terror das demandas irreconciliáveis, um denso Real de esperanças e traumas. 

Nunca temi os militares nas ruas irmanados com o povo, pois seria negar o papel progressistas dos militares na Inconfidência Mineira do Alferes Tiradentes, no grito do Ipiranga, na deposição de D. Pedro I, na proclamação da República, no tenentismo da Coluna Prestes, na deposição do ditador Vargas, no corajoso comando do Marechal Lott em defesa da legalidade. Temo, isto sim, os militares irmanados com as elites corruptas, subjugados pela corrupção, defendendo uma farsa democrática custeada pelo suborno e pelo populismo autoritário, esquecendo-se do grandioso papel histórico em todas as verdadeiras revoluções, inclusive a Revolução democrática dos Capitães de Abril em Portugal.

Se as urnas são falseadas, os políticos são comprados, a Corte Constitucional é covil de corruptos, o Estado de Direito Democrático é sinônimo de Estado Pragmático de Interesses,  que falem as ruas!



Ivan Bezerra de Sant' Anna


Publicado no site http://www.facebook.com/ibezerra52;  e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/