O homem que sempre mudou...
Se as pessoas mudam, o exemplo vivo é o nosso ex-ministro, Carlos Britto. Lembro-me do meu professor Brito, (ele ainda não era Ayres de Britto) no limiar dos anos oitenta, quando era Procurador do Estado (sem concurso) e escrevia contra D. José Brandão, na inesquecível Gazeta de Sergipe, chamando-o de comunista, atendendo aos reclamos da sua família que era inimiga ferrenha dos trabalhadores rurais. Pouco tempo após, o professor era nomeado, sem concurso, para o Ministério Público Especial do Tribunal de Contas, fato esse que premiava a sua primeira fase política que teve início com sua saudação ao golpe militar, chamando-a de Gloriosa Revolução.
Com o fim da Ditadura Militar, o faro dialético do nosso ex-ministro captou novos aromas e novas possibilidades. Seus olhos começaram a perceber que a cor vermelha não era tão feia e mudar era necessário. "Sou socialista", disse para si! Dias após estava candidato por um pequeno Partido político que pressentia ser transitório para seus vôos dialéticos, mas tinha a grande vantagem de lhe dar visibilidade política. E assim fez! Uma campanha política pífia, porém, nada como uma poesia de "pé quebrado” ou uma frase clichê para lhe dar umas porcentagens eleitorais necessárias para acalentar seu sonho mudancista. "De grão em grão, a galinha enche o papo" era sua frase predileta e sempre lhe deu bons frutos, pois algumas coisas devem mudar, mas não todas. Afinal, foi um dialético prático, um homem que sempre conciliou Confúcio com as teses do Esclarecimento, sem esquecer, é claro, dos sábios ditados populares dos oligarcas rurais.
Sua filiação ao PT foi um lance dos mais geniais, mas teve que ser conquistada com muita paciência e senso de oportunidade. Sabia que a amnésia e os interesses pragmáticos se ajudam mutuamente e que seu passado seria esquecido, mesmo porque tudo muda e por que não uma mudança à brasileira, do tipo, "mudar para que nada mude"? O resto foi fácil e muito produtivo: todas as ações judiciais dos sindicatos da CUT nas suas mãos, irmanadas com as mãos ávidas de um parente próximo e a conquista da OAB. Apesar dos bons negócios, dos enormes e vultosos honorários, a riqueza não é tudo!
Verdade, a riqueza não é tudo e o nosso querido ex-ministro sentia uma angústia dilacerante, uma insatisfação, algo que lhe dizia faltar alguma coisa. Um impulso dialético do crescimento, talvez. Assim, não perdeu tempo, pois o cavalo selado estava na sua porta e não poderia perder a chance. Espalhou um boato que era candidato ao governo do Estado, forçando Marcelo Deda pedir ao seu amigo Lula, a sua indicação para uma vaga no STF. No entanto, não contava com a resistência de um setor do PT e de alguns Ministros do STF que não viam nenhum notável saber jurídico nas parcas publicações, a maior parte delas, poesias sem poética. O ex-ministro sabia que o tempo era precioso e recorreu aos antigos lideres políticos que sempre serviu com muito afinco. O senhores Albano Franco e João Alves Filho não se fizeram de rogados, convocando muitos parlamentares, inclusive o Sr. José Sarney para essa gloriosa cruzada.
No começo foi difícil, pois os insultos dos ministros eram constantes, no entanto, nada que o tempo e alguns votos de caráter "popular" não pudessem resolver. Mais uma vez o cavalo selado estava na sua porta, ou melhor: um casamento gay! Não importou ao ministro que a Constituição definisse o casamento como uma união entre homem e mulher, pois isso era apenas um pequeno detalhe, existindo inúmeros princípios abstratos que poderia usar, e, afinal, não são os ministros que fazem a Constituição real? Sabia que estava no Brasil e não em países atrasados como a França, Itália, Inglaterra e outros.
Entretanto, não podia sair do STF, apenas glorificado com um casamento gay. Era muito pouco para sua alma inquieta e apaixonada pelo novo, muito novo, novíssimo. Teria que ser Presidente do STF e colocar o Mensalão em pauta para julgamento. Sim, esse era o grande lance, pois colocaria o processo em andamento, emitiria algumas frases de efeito e como sairia antes dos acórdãos sentenciadores, não condenaria ninguém. O que poderia dar errado? Nada deu errado, apenas sempre existiu a guerra e o eterno jogo de interesses, o que Hegel chamava de contingências, aquelas ações e fatos que medeiam o querer dos sujeitos e os resultados. E uma contingência negra, oriunda das classes subalternas, parecendo um fantasma que voltava das zonas ribeirinhas do São Francisco, roubou-lhe a cena! Como pode um negro, filho de pais remediados, muito parecidos com muitos outros negros que serviam nas usinas de cana do seu avô, ter a ousadia de puxar-lhe o tapete?
A realidade, entretanto, é que o Negão passou-lhe a perna! "Isso é uma das imperfeições da Democracia que precisa ser corrigida", pensou. Entretanto, o bom cabrito não berra, ou melhor: existe tempo para tudo, tanto para o balido ingênuo da ovelha, como para os dentes do lobo. A questão é saber esperar o momento certo. E o nosso querido ex-ministro sabe que esse momento poderá chegar e estará preparado para ele, para dar o seu novo salto quântico.
Ivan Bezerra de Sant Anna