Pesquisar este blog

sábado, 12 de dezembro de 2015

A indulgente pescaria

A indulgente pescaria 




Ao Ministério Público e aos demais órgãos que devem combater a corrupção:

Muitos bairros pobres da nossa cidade estão vivendo um verdadeiro clima de religiosidade e de euforia com a notícia de um novo milagre da multiplicação dos peixes que ocorre na cidade de Pirambu. Imensas romarias estão se formando, todas em busca desse grandioso milagre que acontece na nova Meca praiana. Vocês não sabem? Ora, qualquer funcionário do Ministério do Trabalho possui esses dados milagrosos.

E como soube desse milagre? Não foi difícil. Uma pessoa que vive de faxina, me confidenciou que está havendo uma enorme caminhada para esse município, banhado pelas plácidas águas do Atlântico, o que já ficou conhecido como o "caminho de Pirambu". Peixes, muitos peixes? Não! Um peixe muito estranho às águas das marés, o peixe Aposentado, também bastante conhecido como Aposentadoria de Pescador! A faxineira, que nunca pescou um pobre caranguejo solitário, está eufórica e esperançosa, e não é para menos. Afinal,  um milagre como esse não é todo dia que acontece, e nem o próprio Cristo teve poderes mudar a realidade das coisas. Quando questionei se era  correto esse procedimento, ela disse: "Claro que é! Se um rico comerciante do Santa Maria pode virar um pescador necessitado, por que não posso?" 

"Verdade, por que ela não pode?", interrogou-me uma funcionária do Ministério do Trabalho, completando, sorridente, o seu entendimento: "são inúmeros casos de aposentadoria de pescadores e cada vez aumenta mais. Existem pessoas que basta um simples olhar para saber que nunca pescaram em suas vidas. Atendi um que trajava um belo terno e tinha um broche da OAB. Isso é uma imoralidade, mas que podemos fazer? A ordem vem de muito alto".

A ordem vem do alto? De quem? Será que das mesmas pessoas que compram votos com o dinheiro público; dos que construíram o mensalão ou o petrolão? E acima deles não existe um Presidente minimamente irresponsável para com os negócios públicos? Isso não é um atentado à cidadania e aos princípios reitores da República? Um mandatário que fecha os olhos para esses milagres das mensalidades congressuais, para o milagre das distribuições dos pães recheados de petróleo a um grupo seleto de "companheiros", para uso eleitoral das bolsas "disso e daquilo", não está cometendo um grave atentado à Constituição? 

Acho que um certo jurista de renome deveria aclarar esse conceito, pois a referida tese, em sua formulação  abstrata, está propiciando um outro milagre: um certo ex-deputado, radical dos radicais, depois de muitas participações nas passeatas "fora Dilma", de repente, mais que de repente, recebeu uma revelação, tal como Paulo de Tarso caminhante, uma luz que o cegara e uma voz que alertava-o para o perigo da democracia das ruas. Assim, o nosso nobre ex-deputado percebeu não haver nenhum crime de responsabilidade nas efetivações dos milagres, e prostando-se ao solo, orou com muita devoção de um devoto de-mente, cinicamente  insistente, carente-mente sempre, mas crendo devasa-mente em sua salvação.

E o que vai dizer sobre esses milagres, o Ministério Público? Vai investigar se houve mesmo esse fenômeno milagroso, para posterior "canonização" dos divinos autores? E como o "governo" de transição do Sr. Henri Clay vai se posicionar a respeito, já que prometeu a restauração do respeito da OAB? Poderia indagar a alguns militantes petistas, pelos quais tenho muito respeito, mas devido à partidarização da razão, já sei a resposta: a culpa é do Cunha!


Ivan Bezerra de Sant Anna.


Publicado no site http://www.facebook.com/ibezerra52;  e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/





terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Uma história da Índia

Uma história da India




Em uma província da Índia, local de rara beleza e de riquezas incalculáveis, vivia a bela princesa Najara, filha do poderoso Marajá Kinca. O soberano local era conhecido por sua sabedoria, pelo amor às artes, à filosofia, que evitava as soluções violentas das guerras de conquistas, preferindo os diálogos concessivos e cultivando a tolerância quanto as idéias divergentes, inclusive as religiosas.

Quando a Princesa chegou na idade do casamento, o Marajá realizou um encontro com todos os pretendentes da Índia e pediu a Princesa que observasse a todos, escolhendo, por fim, alguns dos disputantes que mais lhe agradava. E assim a Princesa fez. O Marajá reuniu os escolhidos pela Princesa e lhes disse: "vocês foram selecionados inicialmente pelos seus dotes físicos e desempenho nos jogos de guerra, pois a Princesa foi também educada para ser uma grande guerreira, sendo um dos mais valorosos generais que tenho. Farei a vocês uma pergunta e a Princesa fará sua escolha. Em uma guerra, o que mais lhes cobre de honra sob o manto vistoso do orgulho?"

Todos os pretendentes relataram as suas conquistas territoriais, seus atos de bravura e a quantidade de guerreiros que mataram, variando apenas nas palavras superlativas e na densidade dramática da fluidez poética. No entanto, um dos pretendentes, o Príncipe Hizaz, manteve-se calado, fato esse que causou uma extrema curiosidade ao bom Marajá.

- Por que te calas, Príncipe Hizaz, lhe assusta a bravura guerreira da minha filha, ornada pelo véu da beleza sensual, a qual a mais linda e preciosa pérola se quedaria invejosa?

- Nada me causa temor, Alteza. No entanto, sinto que não estou à altura de ter a mão dessa linda guerreira portentosa. Tenho repúdio às guerras de conquistas e quando tenho que lutar com denodo para defender o meu povo, faço-o com pesar, pois ao matar uma pessoa, algo morre dentro de mim.

"Farei outra pergunta", exclamou o Marajá. "Em suas imaginações, ao primeiro contato com minha filha, o que farão: lhes ofertará  ricos e lindos presentes; ela será enebriada por lindos poemas que soam como  rouxinóis ao amanhecer; ou a lascívia da cama será seu destino?"

Todos se entreolharam perplexos com a indagação real e quase ao mesmo tempo, responderam: "com presentes e poemas, meu Príncipe".

Uma voz se ergueu trovejante: "como se trata uma linda amazona guerreira? Com a corrupção dos presentes valiosos, com sonetos de palavras ritmada que a fazem adormecer ou com o toque suave em sua face como uma borboleta descansando em uma rosa, com um beijo que funde a ternura com a lascívia e com o encontro dos corpos desnudos, enrolados pelo manto da fantasia?"

O silêncio se fez e os olhares pesados, assustados, melindrados, esfomeados, cravaram como dentes sedentos de um vampiro no rosto criança do Príncipe Hizaz. Nesse momento, uma voz suave, como se fosse exalada pela flauta de Pã, se fez presente:

- Por que estão assustados e belicosos, gentis cavalheiros? As palavras são como pássaros que dão volteios livres no imenso céu azul, portanto, deixe-as voar. Quanto a mim, tenho uma terna preferência por aqueles que param em minha janela, ofertando-me um recital, e entre suas sílabas sonoras e pausas significativas, me dizem: "sabe, Najara, um homem pode matar 100 inimigos e será chamado de grande guerreiro; pode ofertar ricos presentes e será denominado de um bom homem; pode ter a eloquência dos que amam as palavras e será filho da Poesia. No entanto, se ele salva uma vida em uma batalha, e reverencia a mulher como o centro do universo, envolvendo-a com o manto da fantasia e dos sonhos, será chamado de filho dileto de Deus."

Najara estendeu as mãos para o filho de Shiva...

Ivan Bezerra de Sant' Anna


Publicado no site http://www.facebook.com/ibezerra52;  e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/