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domingo, 27 de dezembro de 2015

Chico ou Francisco?

Chico ou Francisco? 



Meu caro amigo:

A coisa aqui tá preta, né? Caminhar por nossas ruas, o belíssimo espaço onde gosta de trafegar a linda musa da Democracia, "é pirueta para cavalo ganhar  pão". Quando escapamos ilesos dos ataques dos "meus guris", podemos nos deparar com bandos de "camisas pardas", de "camisas rosas, cidadãos revoltados com a lama putrefata da corrupção, todos em guerra declarada contra todos. Parece que os filhos da "nossa pátria mãe tão distraída" estão insones,  mantidos em um preocupante estado de virgília guerreira. Bem ou mal, caro amigo, o samba deve estar na rua, com seu ritmo alucinante dos tambores rufantes, clamando à participação de todos, em um carnaval que não quer parar e negar que tudo pode ser uma "ilusão passageira que a brisa primeira levou". No entanto, ele não espera por você, amigo Francisco da Galeria, ele espera pelo menino Chico Buarque, aquele que em sua menice criativa musicou os nossos sonhos com um talento fantástico, que, se espírita fosse, acreditaria que Mozart tinha resolvido voltar, escolhendo o gostoso calor tropical da cidade maravilhosa, vista por dois olhos verdes, de um ver-dor sempre verde. Você entende isso, né?


Caro Francisco, estamos vivendo um pesadelo urbano. Somos prisioneiros em nossas casas, enquanto os "meus guris" infestam as ruas livremente. Já foi o tempo em que podíamos andar pelas ruas, sentarmos nas praças  de mãos dadas com pessoas que batizávamos de "o meu amor". Chico Buarque, aquele que você conhece bastante, assustado pelo banditismo dos militares usurpadores, um dia disse:

"Acorda amor 
Eu tive um pesadelo agora 
Sonhei que tinha gente lá fora 
Batendo no portão, que aflição 
Era a dura, numa muito escura viatura 
minha nossa santa criatura 
chame, chame, chame, chame o ladrão".

E eles, os camisas rotas, os vermelhos estrelares, "os de gravatas e capitais", chegaram aos montes...

Caro amigo, não fique molestado pelas vaias que recebe, pois isso faz parte do jogo democrático, mesmo que às vezes aconteçam de maneira imprópria para o local.  Ademais, esses terríveis  garotos de "classe média" não conseguem separar o Chico do Francisco, a personalidade artística da empírica, como aconselhava o grande Oto Maria Carpeaux. Eles não conhecem ou nunca entenderam a mágica tradução "de uma parte em outra parte" do belíssimo poema de Ferreira Gullar. Esse traduzir um Francisco em outro Francisco, "que é uma questão de vida ou morte, será arte", ou melhor: será a grande arte do menino Chico?

Ah, caro Francisco, eles lhe vaiam porque não conhecem a diferença de Chico para Francisco, no entanto, conheço muito bem o Francisco fóbico, tímido, sempre protegido pela família, incapaz de enfrentar de cara limpa as incertezas do mundo. Sei que você nunca traiu luta alguma, pois quem sempre lutou foi o menino Chico que trafegava magicamente entre a dramática realidade e a Terra do Nunca, falando de amor, liberdade e esperança. Entretanto, eles se sentem traídos e como pessoas possessivas, cantam Lupicínio:

"Eu não sei se o que trago no peito 
É ciúme, despeito, amizade ou horror 
Eu só sei é que quando a vejo 
Me dá um desejo de morte ou de dor"

Entenda-os, caro amigo, eles pertencem a um extrato social que é tencionado pelas contradições sociais, e você sabe muito bem o que é isso. Aliás, nós  sabemos, eu, você, a Marilena Chaui e tantos outros que lutaram pela Democracia. Não  entendo, portanto, o porquê de tanto ódio que você e a Marilena destilam contra as pessoas que motivaram os seus sucessos. Será que a Marilena acha que seus livros sobre Spinoza eram comprados e lidos nos bairros ínfimos e nas favelas? Ou que a música do Chico Buarque, caro Francisco, era escutada e tocada pelo povão? Lastimo dizer, mas a maioria do povo brasileiro desconhece ainda a música do Chico, preferindo os Axés e as duplas sertanejas. Se acha que estou errado é porque não conhece a maioria do povo brasileiro, o que não me deixa perplexo, pois quando foi entrevistado por um jornalista se era um grande conhecedor de pássaros, por motivo do sucesso da música Passaredo, você respondeu que conhecia os pássaros por dicionários. É esse, talvez, o povo que conheça: o povo do dicionário!

Onde se encontra o menino Chico que caminhava com magia entre o imaginário fantástico e o drástico Real, caro amigo? Não me diga que ele "flutuou no ar como se fosse um príncipe e se acabou no chão feito um pacote bêbado", porque não vou acreditar. O menino Chico nunca morre, não aquele que nos legou uma música imortalizada pela coragem e beleza. No máximo, encontra-se perdido, emudecido pela tristeza, assim como a voz esconde-se envergonhada do seu dono. Mas para nós, os coxinhas, que fomos a base sólida do seu sucesso, esperamos a sua volta, fazendo minhas, as palavras poéticas do menino Chico:

"Depois de te perder, 
Te encontro, com certeza, 
Talvez num tempo da delicadeza, 
Onde não diremos nada; 
Nada aconteceu. 
Apenas seguirei 
Como encantado ao lado teu".

Ivan Bezerra de Sant' Anna


Publicado no site http://www.facebook.com/ibezerra52;  e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/




terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Impeachemt na razão jurídica

Impeachemt na razão jurídica. 



Carlos Drummond de Andrade disse certa vez que a única Esquerda competente era a Associação de Canhotos de São Paulo. Era o desabafo do grande Poeta, ex-integrante do PCB, entristecido pelo maniqueísmo analítico, pela simploriedade das análises políticas dos dialéticos plantonistas e por imensas divisões em cadeia de grupos, tais como células troncos que subdividiam-se em um processo alucinado. Brigava-se por tudo, até se uma sigla deveria ter a palavra "do" ou não. O velho e bom PCB nasceu porque a maioria dos militantes acharam que o termo "Brasileiro" era mais nacionalista e menos subserviente ao stalinismo do que o termo "doB". Brigava-se por tudo, mas algumas pelejas eram de de muita importância ideológica, como, por exemplo, se a Democracia tinha um valor universal ou eram conceitos dicotômicos, nominados  como Democracia capitalista e Socialista. Como nunca fui afeito às leituras de manuais "de toda a verdade contida", preferindo os densos escritos de Karl Marx, Lenin, Georg Lukács, Antônio Gramsci, Carlos Nelson Coutinho, Leandro Konder e outros, percebi que a Democracia era somente uma, ampliada constantemente em um processo dialético  pelas lutas de classe. A gênese da Democracia sempre foi  as ruas das múltiplas demandas e não as construções arquitetônicas que, por mais belas que sejam, enclausuram a razão e a liberdade do pensar. Democracia Socialista deveria ser o máximo de liberdade e nunca o ambíguo conceito de Ditadura do Proletariado com suas prisões, fuzilamentos e desterros siberianos. No entanto, como pensávamos dessa maneira, éramos tachados como traidores da classe operária, pequenos burgueses, termos que se equivalem atualmente ao mimoso "coxinha".


No entanto, jamais imaginei, por um momento sequer, que esses grupos políticos incluiria a corrupção, a formação de quadrilhas mafiosas, nos seus ideários ideológicos, mesmo como instrumentos pragmáticos, pois nem todos os meios são justificados pelos fins. Poderíamos ser autoritários, pragmáticos, mas ladrões e corruptos jamais! Poderia entender certas atitudes autoritárias e pragmáticas, mesmo que elas alvejassem o conceito de democracia que acredito, entretanto, nunca em defesa de comportamentos criminosos, considerados nefastos por qualquer ideologia que prima por um mínimo ético.

"O uso do cachimbo deixa a boca torta", diz o ditado popular, e por isso nunca levei a sério as juras democráticas de certos Partidos políticos que, em um passado recente, faziam oferendas à ditadura do proletariado. Ora, não me causou perplexidade a ação impetrada ao STF por parte do PCdoB - aplaudida por inúmeros juristas "democráticos" -, porque para os vermelhos de outrora, a Democracia é um valor puramente instrumental, e a lei pode ser uma luva ou uma navalha, assim  "a mão que esmurra Chico, acaricia Francisco". 

Em meio ao cipoal  de frases vociferadas por juristas irresponsáveis e interessados, alguns outros juristas são bafejados pela brisa amena da lucidez, entre os quais destaco o Sr. Ayres de Brito. Já se disse com uma fina ironia que o referido jurista era um poeta do Direito, um tecelão de frases de impacto emocional, o que em parte é verdade. Entretanto, poucos possuem esse poder de síntese, o rabisco de palavras que tocam o emocional, sem perder a densidade e o apelo à racionalidade. O ex-ministro do STF que já se declarou contrário ao impeachemt por não perceber "uma grave violação à Constituição", no entanto, encontra-se firmemente encastelado nas muralhas protetoras da Democracia. Se no passado sua caneta infringiu alguns limites da separação dos poderes, traçando  riscos em papéis defesos, porém, normatizar sobre inocentes relações homoafetivas não causam tantos danos à Democracia. Agora é diferente e o Sr. Carlos Brito está plenamente consciente da gravidade da situação. Usurpar os poderes da instituição parlamentar é o mesmo que subtrair e negar a vontade popular, com possíveis trágicas consequências. Treze homens não podem golpear a Democracia, reescreverem a Constituição, destruírem a ficção verossímil representativa do Parlamento, sem que as terríveis consequências da ingovernabilidade apareçam. Ao fazerem isso, condenaram a instituição judicial à perda de credibilidade e legitimidade institucional. O impeachemt que queriam evitar foi impiedosamente deferido na Razão jurídica e na Democracia.

Por que tanta celeuma por poucas dúvidas e muitos interesses, ao ponto de juristas de renome arriscarem suas credibilidades doutrinárias? A Lei 1079/50 foi recepcionada pela atual Constituição? Se ela foi recepcionada para o processo de impeachemt contra Color, deveria ser para o processo contra Dilma, até porque, apesar de algumas imprecisões conceituais, a lei normatiza um procedimento que avalia se houve   infrações políticas ou administrativas, cominando-as com a específica pena administrativa da perda do cargo e o afastamento provisório de funções políticas. O Instituto que tem feição política, objetiva resultados políticos, é instaurado sob considerações de ordem política e julgados segundo critérios políticos (BROSSARD, 1992, p 75). É nítido o espelhamento do nosso instituto com o similar norte-americano que tem como alvo as infrações políticas e a devida punição de caráter político. "O fim principal do julgamento político nos Estados Unidos é retirar o poder das mãos do que fez mau uso dele, e de impedir que tal cidadão possa ser reinvestido de poder no futuro. Como se vê, é um ato administrativo ao qual se deu a solenidade de uma sentença.” (A. Tocqueville)

É de clareza cristalina que a nossa Carta Maior estabelece o impeachemt como avaliação e julgamento de infrações funcionais políticas, de competência exclusiva do Parlamento, tendo a Câmara de Deputados a exclusiva competência para exercer o juízo de admissibilidade, e ao Senado Federal a competência exclusiva para julgar. Por que a Câmara possui exclusiva competência para exercer o juízo de admissibilidade? Ora, porque os constituintes assim o quiseram! Mas para quem deseja uma explicação sob o prisma da filosofia política, é fácil perceber que sendo a Câmara a caixa de ressonância plural do sociedade, composta por representantes eleitos pelo cidadãos, e sendo o órgão supremo da República, somente ela tem a legitimidade abrangente para exercer o juízo de admissibilidade. Retirar essa prerrogativa exclusiva da Câmara de Deputados  é uma violação literal à Constituição, bem como uma subtração do Poder original do cidadão.

É proibido ao STF a intromissão em um processo de impeachemt, por ser de exclusiva competência do Parlamento, salvo em casos especialíssimos de violações dos ritos procedimentais estabelecidos na Constituição e na lei normatizadora. Cabe exclusivamente  ao Parlamento a avaliação se houve as infrações políticas estipuladas em lei, efetuar o balizamento das provas e proferir a decisão. Todo esse processo sem a interferência do Poder Judiciário, pois ao contrário, o procedimento político seria maculado por mãos oligárquicas.

Resta-nos uma necessária e cruel indagação: havendo uma grave violação constitucional, uma usurpação do Poder popular por parte do STF, o que fazer? Estando a Nação submetida a um estado de inconstitucionalidade, uma tensão de ingovernabilidade permanente, e não existindo a solução do recall jurídico, qual seria a solução que resolvesse esse impasse inconstitucional e ao mesmo tempo preservasse as instituições republicanas? É importante ressaltar que a expulsão da Democracia do espaço simbólico-normativo de uma Nação, pode fazê-la voltar exclusivamente para as ruas, o local onde mora a pluralidade dilacerante das antinomias, com consequências imprevisíveis para as garantias liberais, pois em uma situação puramente fática, a Democracia para se afirmar através das inúmeras e parciais vontades populares, o uso da violência e a supressão da liberdade podem ser inexoráveis.

Ouso discordar do mestre Rui Barbosa quando disse que "a pior ditadura é a ditadura do Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer", pois mesmo nos EUA, País que inspirou a Águia de Haia, existe o Recall, instituto de consulta popular para a resolução de conflitos dessa magnitude. Aliás, mesmo tendo nascida com inspiração oligárquica, uma espécie de Poder moderador, não se encontra na Constituição desse País, nenhum dispositivo que afirme a supremacia do Poder Judiciário. Tudo foi realizado por um processo lento de construções jurisprudênciais da Suprema Corte, sob o manto cúmplice  do Congresso, culminando com a crise constitucional do anos 30, resolvida por um procedimento de auto-contenção da Corte Maior. Na Inglaterra, o controle maior cabe à Câmara dos Lordes, órgão integrante do Parlamento inglês. Na França, o controle de constitucionalidade é político e exercido pelo Conselho de Estado, órgão integrante do Parlamento francês. Em grande parte dos Estados europeus, o controle é técnico-político, exercido por Tribunais Constitucionais, órgãos da República, compostos por membros escolhidos temporariamente pelo Parlamento, Executivo e Judiciário. Ressaltando que na Alemanha, conflitos que envolvam os órgãos eletivos e representativos, no pleno uso das suas funções políticas, as decisões possuem somente o caráter declarativo, ou seja: a decisão não é mandamental ou injuncional, é de orientação.

A atual crise demonstra a imperiosa necessidade de mudanças abrangentes na atual Constituição, em decorrência da existência de arquétipos autoritários que perpassam a nossa Carta Magna. A violação da fórmula gênese da Democracia, "um cidadão, um voto"; a censura exercida pelo Judiciário no sagrado direito de opinião, mais de perto, a horrenda censura no processo eleitoral; as constantes violações à separação dos poderes, com decisões que desrespeitam os órgão eleitos, não somente no tocante à produção privativa da legislação, mas também nas prerrogativas de "conveniência e oportunidade" do Poder Executivo.  Entendo, entretanto, que para a efetivação  dessa tarefa grandiosa será  necessária a convocação de uma verdadeira Assembléia Constituinte, livre e soberana.

No entanto, o que fazer nesse momento crítico de estado de inconstitucionalidade? Sou da opinião que só existem duas possibilidades: deixar  a situação como se encontra, em uma típica solução avestruz, propiciando possíveis soluções fáticas  das ruas, ou a corajosa intervenção do Senado Federal, interpretando o Art. 52, II, III, alínea X, no sentido de afirmar a supremacia do Congresso Nacional, através de uma Resolução senatorial. Se a supremacia do STF foi declarada pela limitação interpretativa da alínea X, inciso III do Art. 52, pelo próprio STF, é imperiosa a intervenção do Senado, aclarando o sentido e o alcance da referida norma constitucional, cassando inconstitucionalidades destrutivas produzidas pelo STF. Nesse embate entre um mero poder formal e o Poder substancial, deve prevalecer aquele que honra a cláusula constitucional de que "todo o Poder é exercido pelo povo de forma direta ou através de seus representantes eleitos". 

Essa é a verdadeira solução constitucional democrática que coroa a supremacia do Poder legislativo, a representatividade plural da sociedade. O Senado Federal vem sendo constantemente desmoralizado pelas ações políticas e pragmáticas do STF. Essa nefasta lógica Data Vênia tem quer ser definitivamente afastada das decisões do Poder Judiciário, sob pena de uma total desmoralização das instituições republicanas.

Por fim, a indagação síntese: se as normas são meras frases indicativas para interpretações abrangentes sem nenhum respeito à literalidade ou a núcleos duros insofismáveis, quem tem o poder da última decisão? Treze pessoas de competências duvidosas, escolhidos por critérios inconfessáveis, sem as bênçãos do voto popular, ou milhões de cidadãos que se fazem representar por Deputados e Senadores? Para que lado pende a bela dama da Democracia?
   

Ivan Bezerra de Sant' Anna


Publicado no site http://www.facebook.com/ibezerra52;  e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/




sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

7 é maior que 93?

7 é maior que 93? 



Como simples comparação aritmética a resposta é  óbvia e evidente, pois os números são ordenados de forma crescente, e dessa maneira, 1 é maior que 2... etc. No entanto, os números expressam grandezas substanciais que são valorados   conforme seus pesos valorativos e ideológicos. Entenderam? Não? Calma, amigos, eu também estou perplexo, mas, infelizmente, essa álgebra vige solenemente em nosso Brasil varonil. Se essa estranha lógica foi inventada na Grécia antiga por Protágoras, o sofista, (o papai celular de todos os advogados) no Brasil ela foi amplamente cultivada, ornada e dissimulada por vários nomes pomposos. Há que afirme que essa tendência de mudar a ordem das coisas foi uma herança lusitana, e o amigo Zé do Mercado relata que em Sergipe existia uma pessoa que fazia uso dessa lógica aritmética com muito brilho e glamour. O nome dele era Cobrinha e era presidente de um time de futebol chamado Atlético Futebol Clube. Seu time invariavelmente perdia, mas o velho Cobra, usando a Lógica Data Vênia, (era assim que ele denominava o seu raciocínio) conseguia argumentar que os gols do adversário tinha sido ilegais e transformava os impedimentos do ataque do seu time em gols válidos. Assim, por exemplo, se o Atlético perdia pelo placar de 4x0, quando ele aplicava a Lógica Data Vênia, o glorioso Atlético acabava vencedor por 7x2. Nesse caso, "0" não é maior que "4"?

Espantados? Não fiquem! Esperem e leiam até o final dessas "mal traçadas linhas". Sabem o que é o maior problema da nossa Democracia? Acreditem, é essa lógica aritmética Data Vênia, pois um simples cálculo aritmético tem o poder de criar a gênese democrática ou  construir uma farsa.  A primeira idéia geratriz da Democracia é uma simples fórmula aritmética que dá equivalência às pessoas na construção do Poder: "para cada pessoa um voto". Essa simples fórmula foi aplaudida pelos pensadores da Democracia, desde de Atenas democrática, até os atuais publicistas políticos. O núcleo mínimo gerador do Poder é o indivíduo e não grupos, corporações, como sonhavam os cultuadores do corporativismo fascistas. Todos os países de democracia avançada respeitam essa singela fórmula, pois quando no passado tentaram usar sofisticadas fórmulas que desigualavam os cidadãos na construção e manutenção do Poder, pagaram um preço trágico. Convém não despertar a ira adormecida do além, a santa irá de um Jefferson, Montesquieu, Alexis de Tocqueville e tantos outros que contribuíram para a construção da Democracia. O preço pode ser alto demais.

E qual foi a fórmula que os nossos pais da Constituição "Cidadã"  escolheram para fixar o núcleo gerador do Poder? Será que nossos "constituintes" - muitos deles biônicos - escolheram a simples fórmula da igualdade, como assim fizeram os constituintes das Constituições do países de Democracia avançada?  Que acham? Fazendo as contas das distribuições de cadeiras parlamentares por Estado e vinculando-as à população residente, usando uma regra de três para auferir a proporcionalidade e.... Eureca! Uma pessoa que mora no Piauí elege proporcionalmente muitos mais deputados federais do que um eleitor Paulista! Seu voto vale por quarenta votos paulistas! Pasmo, me indaguei: e a fórmula universalmente aceita "de cada cidadão um voto"? Cadê ela? Lamentavelmente percebi que os nossos constituintes democráticos tinham copiado a fórmula do voto qualitativo por território que os militares ditadores inventaram sob a inspiração da sorrateira lógica Data Vênia. Mas isso é  o famigerado voto censitário pelo avesso, pensei. Um pobre nordestino é mais cidadão do que um miserável paulista, e isso pode ser a gênese do Poder democrático? Em uma verdadeira República a resposta é evidentemente negativa, mas em uma republiqueta macunaímica, onde as elites comandam um teatro de marionetes, tudo é possível.

Então, caros leitores, "em nossa pátria tão subtraída por numerosas transações", tudo é possível. Aqui o real encontra-se encoberto pelo manto sombrio da noite, e o que é exposto ao mundo solar é apenas farsa. Se algum pintor de real talento fosse retratar a nossa musa da Democracia, não seria a vigorosa mulher com seus seios desnudos,  da famosa pintura "A Liberdade Guiando o Povo" de Eugène Delacroix, mas uma dama de costumes fáceis, uma triste decadente prostituta. 

Dessa maneira, por que o espanto se treze homens de competências duvidosas, escolhidos por critérios inconfessáveis, sem o bafejo do Poder popular, rasgam a Constituição? Afinal, essa cocha de retalhos que alguns pomposos juristas chamam de Constituição Cidadã não já nasceu rasgada e violentada? Não é o apedrejamento o castigo de uma prostituta que vive no país da corrupção fundamentalista? Ora, caros leitores, não estranhem quando dez mil pessoas em uma avenida se transformam em cem mil ou quando 7% é maior que 93%, afinal, aqui vige a lógica aritmética Data Vênia.


Ivan Bezerra de Sant' Anna


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terça-feira, 15 de dezembro de 2015

O milagre de Paulo de Tarso

O milagre de Paulo de Tarso 



Até pouco tempo, o amigo João Fontes, salvo engano, estava nas manifestações "Fora Dilma" sem poupar os adjetivos desqualificativos. O mais interessante é que sua conversão se deu de uma maneira meteórica, tal como Paulo de Tarso, atingido por uma intensa luz, consegue ver com clareza, a verdade eterna.

O que o cegou para as contradições do mundo, dando-lhe a oportunidade para viver a mais profunda revelação interna? Eu que arrisquei minha vida em busca da liberdade e da Democracia, ao lado dos companheiros do PCB, não fui bafejado por essa estranha revelação. Talvez porque o amigo João Fontes sempre foi um homem voltado para as coisas divinas e seus mistérios de grandes densidades, fatos estes que o fez ver que, às vezes, "Deus escreve verdades por linhas tortas". Mesmo achando tudo muito milagroso, quem sou eu para questionar os mistérios de uma revelação?

Sempre tive o entendimento que a Democracia não é reduzida e confinada ao espaço simbólicos normativo de uma Nação, mas tem sua eterna gênese no seio divergente da sociedade, nas plurimas demandas sociais, que se encontram pulsantes  no maior espaço de cidadania republicana, constituído pelas ruas e praças, como disse o poeta Castro Alves: "a praça é do povo como o céu é do Condor".

A Democracia, caro amigo, vive dessa tensão dialética entre o espaço normativo constituído e as situações pré-constituídas do espaço fático da sociedade civil. Sempre haverá o retorno às situações pré-constituídas  para que o processo normativo da Democracia seja renovado. Quando as demandas sociais são sujeitadas à camisa de força de um reduzido espaço de um arcabouço  normativo, as ruas irão falar, protestar e exigir mudanças. Nada é mais democrático e mais perigoso do que as ruas, no entanto, esse aparente paradoxo é o grande motor da Democracia, evidentemente, com ponderáveis  perdas e ganhos.

E para que se minimize os riscos políticos da efervescência das ruas, os conjuntos normativos dos países democráticos possuem corretivos para evitar o divórcio entre a população e os seus representantes, ou que seja viciada a vontade por popular pelos processos de aliciação econômica, como se dá pela compra vergonhosa de votos, financiada por recursos financeiros oriundos da corrupção. Pode existir um "governo do povo" que sua vontade é corrompida por coações econômicas? Um contrato civil não é anulado se for provado que houve forte coação econômica? Ora, caro amigo, para isso existe o processo de cassação dos politicos que usam esse expediente, e o impeachemt para governantes que traíram a vontade popular com o cometimento de crimes de responsabilidade. Longe de ser golpe à Democracia, esses institutos são corretivos para sua efetivação real, e se existe algum golpismo nessa tenebrosa história, esse é perpetrado por aqueles que não honram seus passados de juristas, destruindo a validade mínima conceitual, prostituindo e partidarizando  a Razão. 

Engraçado é a tese que esposa, a da normatividade relativa e relacional. Ou seja: para ser válida uma norma punitiva, os que requerem a sua aplicação devem ser moralmente limpos e não possuam interesses na aplicação da mesma. Segundo esse raciocínio, como existe sempre algum suplente com intenções nebulosas  de um parlamentar processado, então infere-se que a norma não deve ser aplicada. Como o terrível vice-presidente vai se beneficiar de um possível impeachemt da "Presidenta", então o referido instituto, que visa corrigir o processo democrático, acaba virando um instrumento golpista. Essa tese absurda e pragmática destrói todos os resquícios da razão humana, levando-nos à descrença da humanidade, prostando-nos com profunda reverência no altar das certezas do Islã radical.

Caro amigo, más e boas intenções são critérios para um julgamento moral e nunca pré-requisitos de validade para o direto de cidadania e a ampla liberdade para demandar. Em uma democracia não interessa o julgamento do demandante, mas a avaliação criteriosa da demanda. Nunca é demais lembrar da segunda lei de Voltaire, uma das grandes máximas da Democracia, que diz: "Quanto maior o número de candidatos à prática da imoralidade, maior será o controle da imoralidade alheia.". Dessa forma, caro amigo, o nosso grande filósofo iluminista observou que as colisões entre as más intenções tem como resultante um abrangente controle sobre a imoralidade geral. Coisas da "mão invisível" do mercado político...

Fica uma indagação, caro amigo: sua conversão à oligarquia "democrática" foi um retorno às sua raízes familiares ou foi por motivos de fé?

Ivan Bezerra de Sant' Anna


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sábado, 12 de dezembro de 2015

A indulgente pescaria

A indulgente pescaria 




Ao Ministério Público e aos demais órgãos que devem combater a corrupção:

Muitos bairros pobres da nossa cidade estão vivendo um verdadeiro clima de religiosidade e de euforia com a notícia de um novo milagre da multiplicação dos peixes que ocorre na cidade de Pirambu. Imensas romarias estão se formando, todas em busca desse grandioso milagre que acontece na nova Meca praiana. Vocês não sabem? Ora, qualquer funcionário do Ministério do Trabalho possui esses dados milagrosos.

E como soube desse milagre? Não foi difícil. Uma pessoa que vive de faxina, me confidenciou que está havendo uma enorme caminhada para esse município, banhado pelas plácidas águas do Atlântico, o que já ficou conhecido como o "caminho de Pirambu". Peixes, muitos peixes? Não! Um peixe muito estranho às águas das marés, o peixe Aposentado, também bastante conhecido como Aposentadoria de Pescador! A faxineira, que nunca pescou um pobre caranguejo solitário, está eufórica e esperançosa, e não é para menos. Afinal,  um milagre como esse não é todo dia que acontece, e nem o próprio Cristo teve poderes mudar a realidade das coisas. Quando questionei se era  correto esse procedimento, ela disse: "Claro que é! Se um rico comerciante do Santa Maria pode virar um pescador necessitado, por que não posso?" 

"Verdade, por que ela não pode?", interrogou-me uma funcionária do Ministério do Trabalho, completando, sorridente, o seu entendimento: "são inúmeros casos de aposentadoria de pescadores e cada vez aumenta mais. Existem pessoas que basta um simples olhar para saber que nunca pescaram em suas vidas. Atendi um que trajava um belo terno e tinha um broche da OAB. Isso é uma imoralidade, mas que podemos fazer? A ordem vem de muito alto".

A ordem vem do alto? De quem? Será que das mesmas pessoas que compram votos com o dinheiro público; dos que construíram o mensalão ou o petrolão? E acima deles não existe um Presidente minimamente irresponsável para com os negócios públicos? Isso não é um atentado à cidadania e aos princípios reitores da República? Um mandatário que fecha os olhos para esses milagres das mensalidades congressuais, para o milagre das distribuições dos pães recheados de petróleo a um grupo seleto de "companheiros", para uso eleitoral das bolsas "disso e daquilo", não está cometendo um grave atentado à Constituição? 

Acho que um certo jurista de renome deveria aclarar esse conceito, pois a referida tese, em sua formulação  abstrata, está propiciando um outro milagre: um certo ex-deputado, radical dos radicais, depois de muitas participações nas passeatas "fora Dilma", de repente, mais que de repente, recebeu uma revelação, tal como Paulo de Tarso caminhante, uma luz que o cegara e uma voz que alertava-o para o perigo da democracia das ruas. Assim, o nosso nobre ex-deputado percebeu não haver nenhum crime de responsabilidade nas efetivações dos milagres, e prostando-se ao solo, orou com muita devoção de um devoto de-mente, cinicamente  insistente, carente-mente sempre, mas crendo devasa-mente em sua salvação.

E o que vai dizer sobre esses milagres, o Ministério Público? Vai investigar se houve mesmo esse fenômeno milagroso, para posterior "canonização" dos divinos autores? E como o "governo" de transição do Sr. Henri Clay vai se posicionar a respeito, já que prometeu a restauração do respeito da OAB? Poderia indagar a alguns militantes petistas, pelos quais tenho muito respeito, mas devido à partidarização da razão, já sei a resposta: a culpa é do Cunha!


Ivan Bezerra de Sant Anna.


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terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Uma história da Índia

Uma história da India




Em uma província da Índia, local de rara beleza e de riquezas incalculáveis, vivia a bela princesa Najara, filha do poderoso Marajá Kinca. O soberano local era conhecido por sua sabedoria, pelo amor às artes, à filosofia, que evitava as soluções violentas das guerras de conquistas, preferindo os diálogos concessivos e cultivando a tolerância quanto as idéias divergentes, inclusive as religiosas.

Quando a Princesa chegou na idade do casamento, o Marajá realizou um encontro com todos os pretendentes da Índia e pediu a Princesa que observasse a todos, escolhendo, por fim, alguns dos disputantes que mais lhe agradava. E assim a Princesa fez. O Marajá reuniu os escolhidos pela Princesa e lhes disse: "vocês foram selecionados inicialmente pelos seus dotes físicos e desempenho nos jogos de guerra, pois a Princesa foi também educada para ser uma grande guerreira, sendo um dos mais valorosos generais que tenho. Farei a vocês uma pergunta e a Princesa fará sua escolha. Em uma guerra, o que mais lhes cobre de honra sob o manto vistoso do orgulho?"

Todos os pretendentes relataram as suas conquistas territoriais, seus atos de bravura e a quantidade de guerreiros que mataram, variando apenas nas palavras superlativas e na densidade dramática da fluidez poética. No entanto, um dos pretendentes, o Príncipe Hizaz, manteve-se calado, fato esse que causou uma extrema curiosidade ao bom Marajá.

- Por que te calas, Príncipe Hizaz, lhe assusta a bravura guerreira da minha filha, ornada pelo véu da beleza sensual, a qual a mais linda e preciosa pérola se quedaria invejosa?

- Nada me causa temor, Alteza. No entanto, sinto que não estou à altura de ter a mão dessa linda guerreira portentosa. Tenho repúdio às guerras de conquistas e quando tenho que lutar com denodo para defender o meu povo, faço-o com pesar, pois ao matar uma pessoa, algo morre dentro de mim.

"Farei outra pergunta", exclamou o Marajá. "Em suas imaginações, ao primeiro contato com minha filha, o que farão: lhes ofertará  ricos e lindos presentes; ela será enebriada por lindos poemas que soam como  rouxinóis ao amanhecer; ou a lascívia da cama será seu destino?"

Todos se entreolharam perplexos com a indagação real e quase ao mesmo tempo, responderam: "com presentes e poemas, meu Príncipe".

Uma voz se ergueu trovejante: "como se trata uma linda amazona guerreira? Com a corrupção dos presentes valiosos, com sonetos de palavras ritmada que a fazem adormecer ou com o toque suave em sua face como uma borboleta descansando em uma rosa, com um beijo que funde a ternura com a lascívia e com o encontro dos corpos desnudos, enrolados pelo manto da fantasia?"

O silêncio se fez e os olhares pesados, assustados, melindrados, esfomeados, cravaram como dentes sedentos de um vampiro no rosto criança do Príncipe Hizaz. Nesse momento, uma voz suave, como se fosse exalada pela flauta de Pã, se fez presente:

- Por que estão assustados e belicosos, gentis cavalheiros? As palavras são como pássaros que dão volteios livres no imenso céu azul, portanto, deixe-as voar. Quanto a mim, tenho uma terna preferência por aqueles que param em minha janela, ofertando-me um recital, e entre suas sílabas sonoras e pausas significativas, me dizem: "sabe, Najara, um homem pode matar 100 inimigos e será chamado de grande guerreiro; pode ofertar ricos presentes e será denominado de um bom homem; pode ter a eloquência dos que amam as palavras e será filho da Poesia. No entanto, se ele salva uma vida em uma batalha, e reverencia a mulher como o centro do universo, envolvendo-a com o manto da fantasia e dos sonhos, será chamado de filho dileto de Deus."

Najara estendeu as mãos para o filho de Shiva...

Ivan Bezerra de Sant' Anna


Publicado no site http://www.facebook.com/ibezerra52;  e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/






domingo, 29 de novembro de 2015

O riso...

Convém usar com parcimônia o humor e o riso quando o alvo for a corrupção. O humor irônico, subversivo e desestruturador, não deve servir para banalizar a corrupção, colocando-a como algo engraçado que devemos conviver naturalmente em nosso cotidiano. A corrupção é algo que deve gerar revolta e indignação, instrumentos emocionais agregadores na luta contra esse grande mal, e como já disse a filósofa Hannah Arendet, "banalizar o mal é pior do que o próprio mal".

O riso revolucionário e desagregador, e essa é a lição de Henri Bergson, alveja as paixões simuladas, a seriedade dos rituais de dominações de caráter hipócritas, mostrando a face contraditória das majestosas e heróicas elites que mesmo orçadas por pompas e circunstâncias, não passam de palhaços ridículos.

Certa vez conheci uma advogado, lá pelas bandas do município de Ilhéus, que nunca teve nenhuma participação nas lutas pela democracia, no entanto, ao surgir os tímidos raios dos novos tempos, esse colega transformou-se em um socialista, negociou com uma grande central sindical todas as possíveis ações plurimas trabalhista, recebendo vultosos honorários, mesmo que os mesmo fossem excessivos, levando-se em conta que eram decorrentes de ações com muito postulantes. Se um trabalhador lhe perguntava se podia lhe pagar os honorários de 10%, ele respondia que a OAB determinava 20%. Ele se tornou um homem muito rico e se auto intitulou de advogado proletário. 

Para mim, tanto quando a Defensora pública do município, ambos remunerados por magros salarios, esse título de advogado popular e proletário tinha melhor caimento em nossas cabeças e não em um rico advogado que nadava em acordos políticos muito compensadores. No entanto, o advogado das massas proletarias insistia nessa honraria, escrevendo um livro para contar suas aventuras heróicas. 

Ao saber do livro, fui acometido por um acesso de riso, rebeldes gargalhadas que não queriam cessar. Quiz até ficar indignado, raivoso e preenchido pelo ódio, mas foi impossível. Finalmente percebi que deparava-me com um típico caso de competência exclusiva do riso, um relato de um falso Salvador que derrapa no ridículo.

sábado, 21 de novembro de 2015

Sou um advogado?

Sou um advogado? 




Uma carteira me faz um advogado? Olhando bem, nem isso é verdade, pois faltando duas horas para a regularização dos débitos passados, que me permitiriam exercer o meu direito de voto, recebi uma ligação telefônica de uma atenciosa telefonista, informando-me que deveria ir a OAB imediatamente para efetuar uma regularização de um débito que não sabia existir. Imaginem a situação: deveria sair da minha residência às 22,30 hrs, percorrer caminhos noturnos, iluminados pelos olhares gatunos, para regularizar o que pensava estar regularizado. Apesar de me achar um homem destemido, confesso que fiquei paralisado ante a possibilidade de me deparar com os "amigos do alheio", e segundo um conhecido ditado popular, "um gatoso tem medo de um gatuno guloso".

Assim, encontro-me em uma situação macunaímica, uma típica esquizofrenia nacional, de ser e não ser ao mesmo tempo, coisa que faria Hamlet correr alucinado pelas escuras florestas inglesas, mas como convivemos diariamente com os Sacis Pererês, as Mulas Sem Cabeças e os Lobisomens, sempre encontramos um refúgio seguro para a nossa precária sanidade, ao lado da carinhosa Dona Benta, nesse exuberante sítio do Pica Pau Amarelo.

Dessa maneira, caros leitores, preferi continuar a minha infrutífera tentativa de ferir um papel virgem com palavras, frases e parágrafos sedutores, tentando, com enorme esforço, evitar a tentação ao estupro  consentido pelo passivo pergaminho. Talvez a palavra estupro não seja a mais correta, e poderia substitui-la pela grinalda do disfarce que usou Morgana para fazer sexo com Arthur, o Rei de Camelot. Ah, os disfarces, as máscaras, as personas... Isso é tão genuinamente brasileiro... "Mudar para que nada mude", parece até  que Lampedusa nasceu no Brasil... Nas farinhas do mesmo saco, os mutantes e ferozes gorgulhos mudam apenas de peso, impulsionados por uma insaciável fome divina. Quanto material para um bom romance... No entanto, deixo-me levar pelo influência soturna de Fiodor Dostoievski e pelas reflexões faustícas do grande Thomas Mann, percorrendo os insondáveis labirintos da mente humana. 

Em Recordações da Casa Mortos, o grande romancista russo e antecipador da Psicanálise, disse que "a falta de liberdade não consiste jamais em estar segregado, e sim em estar em promiscuidade, pois o suplício inenarrável é não se poder estar sozinho". Concordando  em parte, sinto-me confortável acariciando as minhas memórias de uma época que os advogados procuravam o reconhecimento pelo seus trabalhos nas salas de audiências, nos debates dos Tribunais de Júri e nas difíceis lutas pela emancipações dos direitos dos trabalhadores, entendendo que éramos apenas coadjuvantes de uma luta que tinha como verdadeiros protagonistas, as lideranças trabalhistas.

Só em pensar estar "fardado", urrando palavras de ordem, acompanhado por uma legião de "Datas Vênias", sinto a bofetada horrenda da promiscuidade coletiva, a ausência da liberdade do pensar, encarcerada pelo pensamento monolítico das turbas, comandadas por lideranças egocêntricas e com objetivos secretos inconfessáveis. Afinal, por que essas marchas públicas, debates nas mídias televisivas, contratação de empresas publicitárias, produtoras de vídeo, todo esse aparato caríssimo, para convencer um pequeno colégio eleitoral composto de advogados? O que está em jogo realmente? Pelo que sei, a população não está interessada na eleição da OAB, pois não exerce o direito do voto representativo. Se ao menos fosse discutido o imenso problema da corrupção, do patrimonialismo nefasto, a tormentosa questão do impeachemt, esses glamorosos debates podiam servir para o esclarecimento popular. Entretanto, para a infelicidade das pessoas, nenhuma singela palavra.

"O mais extremo fervor dedica-se ao que é totalmente suspeito", disse com muita acuidade, o mestre Thomas Mann. Se a aureola da suspeição coroa as cabeças de uns poucos iluminados, para a grande maioria dos colegas é devida grinalda de Hera da princesa adormecida, uma premiação pela ingenuidade delirante e pelo esquecimento de um passado, onde os advogados citavam menos, porém diziam mais. Diz, Zé do Mercado, o filósofo do Thales Ferraz, parafraseando Montaigne, que se retirarmos todas as citações das petições e dos atuais livros escritos pelos "Datas Vênias", sobrariam pouquíssimas palavras que, sem usar o recurso do exagero, poderiam estar contidas em um telegrama. 

Ivan Bezerra de Sant' Anna 








domingo, 8 de novembro de 2015

Mulheres e pérolas

Mulheres e pérolas  



Espero que vocês não entendam esse escrito apimentado pelo humor, como algo pornográfico, uma espécie de véu que esconde propósitos maliciosos. Essa história com traços de humor sensual, contaram-e em forma singela, a qual dei pinceladas na sua moldura.

"Estavam o mestre e seu dileto discípulo em uma boa conversa de fundamentos filosóficos, quando, de repente, o ancião de longa barba branca, arrematou uma indagação inesperada:

- Gafanhoto, qual a principal diferença entre uma mulher e uma pérola?

Surpreendido por uma pergunta tão incomum para os treinamentos meditativos, o confuso discípulo, em meio a um turbilhão  de pardais em revogada, gaguejou:

- Iluminado mestre, são tantas as diferenças, como são inúmeras as estrelas que salpicam o tapete celeste.

- Oferte-me uma somente, aquela que primeiro invadir o seu pensamento.

O pobre Gafanhoto hesitou, sentiu a fina camada de gelo rachando aos seus pés, porém os hormônios da juventude e as irremovíveis tentações que o faziam perder longas noites, determinaram seu seu tímido assobio.

- Amado Mestre, antecipadamente, peço perdão por palavras tão vulgares, mas foram elas que aprisionaram a minha mente, tal como o desejo pela maçã ofertada pela serpente. Acho as pérolas podem ser furadas nos dois lados e só às mulheres pertencem em liberdade. Já as mulheres, somente podem ser furadas em um lado e aos homens pertencem.

- Você me faz rir, Gafanhoto. Que reflexão! Não sabe que existem mulheres que gostam da liberdade e apraze-lhes os dois furos?

- Sei, queridíssimo Mestre. No entanto, essas que deu como exemplo, não são mulheres, são belíssimas pérolas!"


quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Para esclarecer

Particularmente, nada tenho contra o Sr. Henri Clay ou o Sr. Cézar Britto, o comandante dos bastidores dessa chapa. Ao contrário, tenho o mais profundo respeito pela carreira profissional do grande mentor dessa chapa.

No entanto, algumas considerações devem ser feitas, visando uma maior transparência das informações. Acho importante que o Sr. Cézar Briito não tente esconder que é petista, uma opção que fez já a algum tempo. Sabemos que esse senhor controla a OAB ao longo de 12 anos, e ao transcurso desse tempo, essa instituição selou um acordo com o lulismo, fato esse de caráter inegável, não precisando maiores investigações ou mesmo interpretações sofisticadas.

A OAB representa a totalidade dos advogados e não deve, mesmo de maneira disfarçada, filiar-se a grupos políticos. Esse órgão é composto de profissionais de variadas tendências políticas e deve primar pela imparcialidade política-partidária, centrando seus objetivos na defesa dos interesses da advocacia e dos direitos civis de cidadania.

Infelizmente, o que assistimos perplexos, são declarações de Diretores da OAB que beiram ao ridículo, a desfaçatez, e ao adesismo simplório ao lulismo, chegando ao ponto de atacarem juízes que investigam a pior corrupção já noticiada nesse País. É lamentável que esses senhores, pertencentes ao grupo do Sr. Cézar Britto, atuarem como advogados do lulismo, quando deveriam estar defendendo toda uma categoria. E que advogados! Faltam-lhes um mínimo ético, o respeito pelos institutos juridicos que são usados e reconhecidos por todos os países de democracia avançada, tal como, a delação premiada, por exemplo. No afã pela defesa dos seus companheiros "ideológicos", praticam um pragmatismo vil e irresponsável.

Dizem que estão defendendo os princípios basilares da Democracia, o que de fato é muito preocupante. No entanto, talvez tenham razão! Olhando sob o prisma da real democracia brasileira, sob o primado de regras constitucionais confusas e ambíguas, o nosso sistema político é de uma peculiaridade estonteante! Talvez seja o caso de uma nova conceitualização  que se adeque ao nosso esquizoide sistema democrático, e nesse caso, as sugestões oriundas dos cartazes nas ruas podem ter grande serventia. Por que não Cleptocracia?

Os nossos colegas devem isentar-se de qualquer interesse pessoal na hora do voto, porque isso é que se espera de um profissional digno que defende a grandeza da OAB. É importante lembrar que a responsabilidade é indeclinável, queiramos ou não. Vale à pena sempre lembrar as sábias palavras da filósofa Hannah Arendt: "No holocausto, algumas pessoas são culpadas, porém todas são responsáveis".


terça-feira, 27 de outubro de 2015

Não

Não 

Ao nascer
Berrei um Não  
E na linha do tempo 
Formo e transformo
Dizendo Não 

Às baionetas que calam caladas
Os afagos dos porretes esclarecidos
Milícias das palavras gatunas
Pardas nos telhados soturnos    
Não! Um sonoro não!

Às mulheres posseiras
Propriedades devolutas
Julietas sem magia
Canto engaiolado
Gaguejo assustado
Um abismado Não 

Se o ovo anuncia
Desdita profecia
Morro em cada dia
Faço do Não 
A magia
Da noite 
O dia

Das ondas quebrantes 
As espumas insistem
Não, elas dizem
Eclodem da dor sentida 
Areia úmida e maresia
Ondas assumidas
Logo mar outra vez



quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Coincidência ou uma repetição trágica?

Coincidência ou uma repetição trágica?


Em um País em forma de bota, local que desfilou o triunfalismo romano, onde atualmente se come pizza e dança-se a tarantela, nasceu e morreu o Juiz Giovanni  Falcone. Se foi em solo romano que o moderno Judiciário teve origem, foi nesse mesmo rincão que as famílias senatoriais patrícias e poderosas plantaram suas vigorosas sementes oligárquicas, uma trágica herança que impediu o florescer autêntico das instituições republicanas, lançando esse milenar território em trágicas e dilacerantes contradições. Em um cenário de um Judiciário trôpego, hesitante, refletindo as mazelas de uma sociedade corrupta e patriarcal, ergueram-se os punhos rijos de uns poucos juízes, dentre eles, Giovanni Falcone. Uma história de beleza e dor, de um lirismo trágico de um Prometeu da esperança, que no negro enlutado da sua morte, renasceu o Fênix da dignidade judiciária.

Se não temos um passado heróico para o reporte histórico, temos as mesmas estruturas apodrecidas por heranças pretéritas, pela corrupção conchavada, por um populismo que exala o odor das ditaduras tirânicas. Por hora, substituímos as baionetas por canetas maliciosas, e nossas mudanças se resumem a isso: um puro populismo sem princípios e enganador!  E nessa peça teatral nefasta, onde o dramático assume, por vezes, os ares de uma comédia bufa, não se permite o improviso subversivo, seja por vaidade ou por senso moral, pois a improvisação traz em seu bojo uma incógnita perigosa para as nossas acomodadas elites. E se o improviso na terra da bota foi denominada de Falcone, em terras brasileiras tem o nome de Sérgio Aldo Moro, um juiz de rosto romano e nome italiano.

Que nome deram ao pequenino Sérgio! Que responsabilidade histórica e tragédia anunciada esse nome traz! Aldo Moro, um líder da Democracia Cristã, um sonhador que tentava fazer um governo de coligação com os comunistas do PCI, visando um desenvolvimento integrado e eficaz, foi barbaramente assassinado por falsos comunistas, sob aplausos secretos da CIA, e um desses terroristas assassinos vive foragido, protegido pelo governo brasileiro. Entretanto, o juiz Sérgio Aldo Moro, apesar das muitas coincidências, não é Giovanni Falcone. Se ambos lutavam contra uma máfia poderosa, foram incompreendidos por alguns dos seus pares, sofreram difamações pelos advogados dos mafiosos, tiveram suas reputações enxovalhadas, o rosto quase bobo de Falcone, contrasta com a face quadrada e dura de Aldo Moro. Lá na Itália, nenhum jurista do porte de um Bandeira de Melo, Dalmo Dallari, Gibson Dipp, tiveram a petulância oportunista de tentar destruir reputações de magistrados, como tentam fazer esses senhores, desprezando a necessária  responsabilidade política e ética. 

É lamentável o pragmatismo desvairado desses publicistas, quando tentam alvejar institutos jurídicos, aceitos por todo o mundo civilizado, como é o caso da Delação Premiada, em um profundo desrespeito conceitual e ao empirismo jurídico, o que faria o sofista Protágoras se remoer de inveja. O Sr. Falcone, apesar do seu destino trágico, usou a delação premiada do Sr. Tommaso Buscetta  para instruir o processo que levaria para a cadeia toda a cúpula dirigente da máfia siciliana, sem que nenhum jurista de peso ousasse  destruir a credibilidade dos instrumentos jurídicos, necessários para o combate eficaz da criminalidade organizada. Afinal, lá na Terra da Bota, mesmo os grandes advogados que vivem representado os seus clientes criminosos conhecem os limites, a fronteira que separa o digno exercício da profissão do proselitismo, de um populismo irresponsável que tem como consequência a prostituição de todo arcabouço jurídico de uma Nação.

Esses "juristas" não só tentam, como advogados desesperados, transformar os institutos jurídicos em meras mercadorias acessíveis aos variados prazeres e interesses, como pedem o afastamento do Juiz Sérgio Aldo Moro por cometimento de excessos que violam a ampla defesa ou o "due process of law". Claro que existem violações e excessos! Não restam dúvidas que o aparelhamento do STF, a partidarização da OAB pelos dirigentes atuais, comandados pela "eterna eminência parda", o grande mentor da partidarização, é uma grave violação à independência representativa da OAB e um atentado ao ideário republicano. Esse órgão não é uma bancada de advogados pragmáticos a serviço do PT, mas um ente jurídico representativo de toda a categoria, composta de profissionais de variados naipes ideológicos e preferências políticas diversas. Declarações acintosas como as do Sr. Eduardo Miranda são por demais excessivas e indignas para um dirigente da OAB, com caimento melhor para um porteiro de bordel ou na melhor hipótese, para um advogado desesperado "de porta de Delegacia".

Esses são os nossos defensores da Constituição Federal. "Não pulem a cerca", dizem, mas encontram justificações para um "pulinho inocente" em atendimento aos seus desejos lascivos. Entre o democrático e o golpe, o licito e ilícito, o instituto do impeachemt flutua em um pântano das incertezas, esvaziado de qualquer densidade conceitual, e crime de responsabilidade política que devia ser conceituado pelo Parlamento, enquadrado na moldura da culpa in vigiando e da negligência administrativa, transformou-se em "grave lesão à Constituição", segundo as palavras de um ex-ministro do STF. Entre o impeachemt colorido e o possível impeachemt estrelar, existem muitas semelhanças, entre as quais, a presença da Construtora Odebrecht como figurante maior na constelação da corrupção. Quanto às diferenças, jamais se viu algo parecido como o mensalão e o petrolão, duas organizações criminosas que vicejaram dentro de empresas públicas e ministérios, dois processos conspirativo que tingiram de lama às instituições republicanas, e se isso não for uma "grave lesão à Constituição", vamos acender as fogueiras e queimar os livros.




Ivan Bezerra de Sant Anna    

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

A criança e a águia

A criança e a águia 

A foto de uma criança morta na praia, vítima de um trágico afogamento, correu os ares do mundo como uma gaivota triste, cantando um monótono estribilho. Parecia estar dormindo, banhado por águas plácidas e acolhedoras de um Atlântico de azul profundo, mas o belo oceano pode ser cruel e traiçoeiro, como todas as forças insondáveis da Natureza.

Entretanto, não foi as mãos do acaso que a colocaram sob os auspícios das forças contraditórias da Natureza, mas o egoísmo possessivo de uma ideologia perversa, temperada por condimentos nacionalistas e religiosos. Não muito longe, milhares de crianças são mortas sob as esteiras de tanques israelitas que hasteiam a bandeira de um povo eleito por Deus, ansiando pela expansão territorial, não importando o custo da empreitada. Que Deus estranho! Talvez agora se explique o Holocausto nazista, as famigeradas Cruzadas, todos em nome de um Deus de um povo eleito, inimigo mortal de um mundo humano e diferenciado.

Longe de tudo, uma ave de rapina bate suas asas gananciosa, paira soberana, emite um dilacerante assobio pelo seu temível bico curvo. Para ela não existem os deuses dos povos que guerreiam, mas um só Deus, a divindade do Capital que reina sobre o mundo. Que se matem por seus deuses, criem facções, dividam os países, destruam culturas milenares, pois tudo isso levará ao deus do Capital a um longo e grandioso reinado.   Por gastar suas garras afiadas se pode financiar guerras civis, como, por exemplo, a do Egito, Líbia e Síria? E uma ajudinha do enlouquecido Estado Islâmico é sempre bem recebida, - para isso existe o teatrinho de ódios hipócritas - a exemplo da preciosa ajuda de Abin Laden no Afeganistão comunista. Quanto aos refugiados dessas guerras insanas, isso é problema para Europa. Ela que se vire para alimentar e arranjar empregos para os refugiados, que já a muito tempo fazem esse percurso. E se a França, por exemplo, se tornar um estado islâmico, devido ao aumento constante da população muçulmana? Ah, tudo ao seu devido tempo, pois a única preocupação da portentosa ave é proteger os filhos de David, irmãos diletos e cúmplices, unidos pelo laço da ganância pelo vil metal,


Não foi Netuno que fez adormecer eternamente a desafortunada criança em uma solitária praia. Os deuses gregos, mesmo saboreando humores díspares, são demasiadamente humanos. Se seus olhinhos não mais verão as luzes das estrelas, suas mãos não poderão  acariciar uma flor, seus pés não mais correrão pela mágica relva da vida, isso se deu por exclusiva responsabilidade de uma ideologia egocêntrica, cultuada por aqueles que detém quase toda riqueza do mundo, e vivenciada por nivelados consumidores, despidos de toda a dignidade diversificada do ser humano.

Ivan Bezerra de Sant Anna     

sábado, 29 de agosto de 2015

Machista ou mulher virtual

Machista ou mulher virtual?

Existem certos acontecimentos que nos deixam tristes e com poucas esperanças nesse rebanho de pessoas que denominamos de humanidade. Crueldade, idiotice, cretinice em alto grau, laivos de sociopatia, o que pode explicar o comportamento lamentável de uma pessoa que expõe um momento de intimidade sexual com outra pessoa na rede social? Como entender que um ato de intimidade compartilhada por duas pessoas que buscam o prazer, possa servir de um propósito vil, almejando, tão somente, humilhar um colega de farda, com uma tentativa calhorda de fazer publicidade dos seus méritos de caçador individualista possessivo. Aliás, como demonstrou esse vídeo nefasto, o que se viu foi uma anti-propaganda de um pênis semi-mole, impotente para a grande fêmea que ali estava.

Não culpem essa moça pelo impensado suicídio do seu noivo, pois se existe um responsável, este foi, sem sombras de dúvidas,  esse pobre imbecil, buscando afirmar sua condição de macho precário. Que machismo nefasto! Essa moça apenas queria um momento de prazer diferenciado, como outras tantas mulheres que tentam se desvencilhar das amarras inibidoras do machismo possessivo e egoísta, caminhando nas veredas da ampla sexualidade feminina, uma dádiva do misterioso universo, tão pouco entendido pela pequenez do macho. Taxar esse momento de prazer como uma traicão nefasta é não perceber a enorme  hipocrisia das normas sociais dominantes, e  a grandeza do prazer como um momento de êxtase, um encontro com a totalidade do Ser. A mulher-loba não comete traição; ela uiva para a Lua em busca dos seus sonhos e desejos, e o gozo que conquista, traz o cintilar para os seus olhos, uma luz que ilumina os tortuosos  caminhos da existência. Ama-la, não é tarefa para um macho pequeno e inseguro; é necessário ser muito homem!

Quanto a essa sórdida pessoa do pênis bambolê, um conselho: percebe-se pela flacidez da sua principal arma que uma fêmea em pleno gozo lhe assusta. Ou será que uma vagina desejosa lhe causa um pavor inconsciente? Quem sabe se uma verdadeira mulher não é a sua "verdadeira praia"? Que tal participar das paradas Gay e lá se sentir mais "em casa"? Essas são indagações que você deve responder com honestidade, objetivando a sua real felicidade. Na minha modesta opinião, pobre criatura, você não passa um mísero caçador de troféus das mulheres que mata simbolicamente para tentar resolver o tormentoso dilema com sua persona feminina que tanto lhe apavora. Um verdadeiro homem - o que possivelmente jamais será - dialoga com sua persona feminina, entende os seus desejos e pode, de vez em quando, penetrar na fantasiosa Terra do Nunca. O verdadeiro macho é aquele que a sua mulher interna é caracterizada  pela suave e eterna carência da mulher externa que lhe alimenta de fantasias, amor e humanidade. Tenho a impressão, triste garoto, que já matou virtualmente tantas mulheres para roubar suas almas que já não precisa viver essa complexa dialética existêncial, pois já é a propria mulher. Ou melhor: de um "querer ser" inconsciente para o "pensar ser" arbitrário e dramático, essa será sua permanente psicose que confundirá como uma opção de escolha. 

Esse  dia chegará suavemente sem que perceba; tudo é uma questão de tempo e oportunidade.

Ivan Bezerra de Sant Anna

domingo, 9 de agosto de 2015

Meus irmãos...

Meus irmãos...

Essas foram suas últimas palavras que proferiu ao tombar da tribuna em uma tarde festiva no dia consagrado a São João, o padroeiro das festas juninas que lhe emprestara o nome de chegada e de partida. Se o seu coração resolveu parar de bater, desfalcando a orquestra de zabumbas juninas, ouço, ainda hoje, os ecos sonoros de humanidade que eram germinados pelos seus punhos guerreiros e por seus poemas embebidos pela seiva da vida autêntica.

Era de um tempo em que as cores rubras significavam esperança por um mundo melhor, igualitário e mais fraterno, e não o engodo, o roubo dissimulado das esperanças de um povo sofrido pela exploração. Havia muita dor, mas a esperança da caixa de Pandora era mantida intacta, protegida da ganância dos ladrões  noturnos que negavam a evidência solar, pois na noite, "todos os gatos são pardos". Era uma época de dor e esperança, diferentemente da atual, permeada pelo pós-niilismo dos gatunos esperançosos.

Com mais da metade da minha jornada existêncial transcursa, percebo, finalmente, que não tenho saudade de ti,  por uma simples e sigela razão: você nunca se foi, e se ergo o punho, rascunho palavas, sofro com as dores do mundo, alegro-me com o florescer de um sorriso de uma criança e homenageio diuturnamente à centralidade essencial das mulheres, faço-o, em parte, impulsionado pelas cordas ressoantes do seu coração.

Obrigado, meu irmão, por me fazer enxergar que a verdade não se encontra nas dissonâncias dramáticas do Real e nem nos sonhos idílicos das fantasias imaginadas, mas de mãos dadas com Dionísio e Apolo, no transcurso do dia e a noite, no crepúsculo avermelhado, no caminho que quer caminho.

Ivan Bezerra de Sant' Anna


segunda-feira, 20 de julho de 2015

Rosa, a filha da Lua

Rosa, apesar de ser minha sogra, - não existe ex-sogra! - temos mais uma coisa em comum: somos filhos da Lua, conclusão inderrogável para aqueles que nascem sob o signo do simpático caranguejo.

Ora, uma rosa é uma rosa, e desconfio que se ostentasse outro nome, não conseguiria deixar de ser Rosa, como disse Julieta ao abobado Romeo, do alto da sacada dos sonhos. Nenhum nome ou sobrenome poderia ter o poder de ofuscar a sua essência, o perfume que irradia, o brilho clorofila dos seus sonhos.

A sua competência conciliatória, a sua dedicação  obstinada ao trabalho, que para muitos era sua característica indelével,  para mim era uma habilidade estratégica, uma renúncia consciente dos seus verdadeiros anseios, um ato de amor por aqueles que tinha o dever de proteger. Quantas vezes, em meio a uma conversa, descobriámos que não respondia porque estava no "mundo da Lua"? Ou que o aparelho de televisão ligado não passava de um bom e prestimoso sonífero?

E quem é verdadeiramente Rosa?  A linda e faceira morena que ostentava o sobrenome Nascimento, herança do bom e sorridente João, livreiro sonhador que albergava os pensadores de um novo mundo, dentre eles, Jorge Amado? Ou Rosa Freire, sobrenome dignificado pelas lutas escarlates do grande intelectual Franco Freire? Desconfio que por mais grandiosos que sejam esses sobrenomes, Rosa lhes deu uma dignidade impar que jamais tiveram. Algo sutil, luminoso, muito raro em tempos inconclusos: a tolerância libertária!

"Rosa morena
Pra onde vai morena rosa?
Com essa rosa no cabelo
E esse andar de mulher prosa?"

Ah, poeta, isso nem a Lua sabe...

Ivan Bezerra de Sant Anna


sábado, 11 de julho de 2015

Rosalvo, o Bocão

Rosalvo, o Bocão


Em meio a um inverno peculiar, um julho onde se conflita uma brisa resfriada com a teimosia do sol, morreu Rosalvo Alexandre, o Bocão. Não existe um bom dia para se morrer, e embora seja imperativo, a nossa marca da finitude que deixamos em mãos do acaso ceifador, fiquei feliz que tenha sido em um dia que ainda se escutava o ressoar das sanfonas juninas.

Em meio a tantos lamentos, poesias revolucionárias ofertadas, lágrimas verdadeiras e louvações hipócritas, reflito com carinho sobre os bons  momentos vividos ao lado do ex-companheiro do PCB, o Partidão, como se referia o nosso Rosalvo, com uma voz "suave" que se ouvia a quilômetros de distância. Se existiam marcas registradas, essas eram seu vozeirão de alto-falante de quermesse, seu constante entusiasmo e sua competência imensa para o trabalho de organização do Partido. Defeitos? Inúmeros e incontáveis que, mesmo com muita boa vontade, não poderia contá-los com os dedos das mãos. Mas que não os têm? Alguém atiraria a primeira pedra?

No dia que choveram ovos no Maluf - esse mesmo que hoje é companheiro dos esquerdinhas - a grande mídia alardeou que a população aracajuana espontaneamente demostrava seu repúdio a um legítimo herdeiro da Ditadura Militar. Poucos sabem que essa espontaneidade deve-se aos companheiros Rosalvo Alexandre e Marcelo Bomfim, que passaram as horas precedentes ao evento, lotando ônibus com pessoas e carregando muitas caixas de ovos espontâneos. Essa era a sua principal marca, e confesso que na hora que começou a chover ovos revoltados, pensei ter ouvido uma voz de comando que faria um doce gatinho virar um felino predador.

Rosalvo era a própria contradição que sempre renunciou ao abrigo de uma síntese, mesmo que precária. Era um retrato representativo de um povo que por momentos é dócil e amoroso, por outros, barraqueiro e indomável, mas sem nunca renunciar à ternura. Sua voz de pássaro Ferreiro que se ouvia à distância, incomodava a muitos, porém acalentava e protegia o sono de outras pessoas, tal qual os estridentes apitos dos guardas noturnos da minha infância. Não era grande nem pequeno, bom ou mal, virtuoso ou devasso: era simplesmente Rosalvo Alexandre, o Bocão.

Pensei em visitá-lo, mesmo sabendo quanto estávamos distanciados por nossas escolhas, mas fui egoísta e covarde. Peço perdão por essa falta lastimável, no entanto, ficava triste só em pensar que seu corpo não mais lhe obedecia como antes e sua voz minguava a cada dia passante, um simples arremedo, um sussurro de lamento, tênue assobio dos ventos crepusculares.

Poderia lhe dizer, "vá em paz, companheiro", mas faltaria com a verdade sentida. Você sempre foi o filho dileto do Deus Dionísio, a própria natureza encarnada, a força dos punhos, a suavidade do afago; a tempestade que varre, as brisas que acariciam; o voluntarismo cego, o sonho de uma crença.

Continue cantando, Ferreiro.

Ivan Bezerra de Sant Anna.


sábado, 27 de junho de 2015

Deus dança...

Deus dança...


Nos primórdios da existência humana, três comportamentos ritualísticos foram essenciais para o desenvolvimento da coletividade humana: o sexo, os encontros  em volta da fogueira e a dança.  O sexo tão instintivo, natural, selvagem e prazeiroso, era a flecha do cupido, o toque do encontro de  Eros, o inicial prazeiroso toque entre o homem e a mulher. Naqueles idos remotos, antes do verbo, o princípio era o sexo, algo gostoso, inocente, o erótico sem culpas ou Édipos, sem o pecado das crenças, segundo as belas palavras de M. Béjart, "o erotismo é a vontade de negar a morte, a afirmação da vida. O erotismo pertence ao sagrado".

Veio o Verbo e com ele, o fogo das fogueiras, iluminando o entendimento entre as pessoas, tentando burlar a noite que avançava. Mal sabiam eles que as fogueiras serviriam para queimar pessoas, livros, calando as vozes do diálogo e dignificando as trevas. No entanto, apesar de tudo, a pureza das fogueiras primordiais, o fogo luminoso do entendimento, resistiu ao tempo, salvaguardado pelo desenvolvimento dialético. A velha fogueira, o centro de acalanto socializador, foi  guardado nas praticas tribais africanas e de maneira acanhada, nos festejos a São João. Onde estão as fogueiras juninas da minha infância, onde em sua volta havia milho, conversa e dança? E o céu junino, sem o tráfego congestionado pelos aviões do forró, era tracejado pelas multicores luzes dos fogos de artifícios?

Entretanto, a dança resistiu, apesar das coreografias ridículas, salpicadas por versos de um romantismo sem amor, das Bandas tipo "mulheres disso e daquilo", composta por mulheres que não conhecem o valor central da mulher no mundo e não passam de meros produtos do mercado sexual. A Quadrilha, herdeira das lindas cadências da dança francesa, associada ao nosso sensualismo brejeiro, hoje não passa de uma coreografia grotesca, um festival de roupas exóticas, uma suposta dança de pessoas fantasiadas de cangaceiros, uma elegia ao mau gosto e a história criminosa de um bandido sociopata.

A dança vale por si só, não sendo instrumento de realização de outros objetivos, a não ser estar em comunhão com o mundo, com o ritmo da existência. Dançando a dois em um xaxado ou em um prodigioso e alucinado tango, estamos em sincronia com o mundo em união com o Todo. Como dizia um velho mestre de Yoga, "a dança também é união. Você é dançarino. Shilva, o senhor do mundo, o grande yogi, tem igualmente o nome de Nataraja, o rei da dança... Você é dançarino, você tem sorte. Que sua dança seja sua yoga, não procure outro".

"Dançar é aprender o movimento dos deuses", disse Kishiro Matsumoto. Entre um rodopio e outro, de repente, um êxtase supremo, de duração ínfima, assim como um gozo do prazer amante, mas de profunda verticalidade em busca da radicalidade do Ser; um shamandi, onde o nada é menos do que nada, um falso vácuo que origina a grande aventura humana. Dançar à vida não é brincar de ser Deus, mas sentir a ideia de Deus como união de todos aqueles que, apesar das inúmeras diferenças, batem os pés no chão da igualdade solidária.

Eu não acredito em um Deus sério, moralista, que distribui punições e não sabe dançar. Prefiro um xaxado muito arretado, o milho pipocando na fogueira, pessoas rindo em sua volta, ao arrependimento penitente das missas ao domingo. Eu só poderia acreditar em um deus que soubesse dançar. E como falava Zaratustra, nas palavras de Nietzsche, "aprendi a andar, desde então, deixo-me correr. Aprendi a voar, desde então não preciso mais que me empurrem para mudar de lugar. Agora sou leve, agora voo... agora um deus dança em mim."

Ivan Bezerra de Sant' Anna

terça-feira, 9 de junho de 2015

Os quebra-santos

Os quebra-santos
 



Na minha meninice, quando se queria chamar uma pessoa de louca ou amoral, dizia-se que ela era um quebra-santo. Salvo engano, tinha um louco que perambulava na cidade que tinha essa alcunha. Coisas do passado, de uma cidade provinciana, embebida pela religiosidade predominantemente católica. Os tempos mudaram, mas o que era apenas uma referência nominal, transformou-se em atos concretos de cunho propagandístico, com os evangélicos quebrando estátuas de santo na frente das câmaras e nas passeatas gay, um festival de quebra-quebra de variadas estátuas santificadas, o que provocou um comentário curioso do amigo Zé do Mercado: "Amigo, o Coliseu voltou".

Esses comportamentos são, no mínimo, curiosos e instigantes. Quanto ao comportamento de algumas seitas evangélicas, a crença alienada, associada com interesses inconfessáveis, talvez explique esses comportamentos intolerantes e desrespeitosos para com os católicos brasileiros, transformando-os em mártires das feras da intolerância, no Coliseu da mídia. Enquanto patrocinam esse macabro festival, os "Bispos" universais e mundiais regalam-se no luxo, financiados por atos de estelionato social, fabricando "milagres" e outros enganos que visam subtrair o pouco dinheiro que resta de uma população de miseráveis.

No entanto, um grupo que sempre foi discriminado pela intolerância homofóbica não poderia patrocinar atos provocativos de intolerância, pois estariam reproduzindo os arquétipos intolerantes e retroalimentado as forças repressores de um passado, do qual foram uma das vítimas preferenciais. Uma contradição absurda! Os rapazes e moças "alegres", embebidos por uma ânsia compulsiva à provocação inconsequente, não conseguiram refletir sobre o exemplo da tolerância do Nazareno e atiraram-lhes pedras ou melhor: criaram uma pantomima de uma crucificação e em vez da lança romana que lhe perfurou o coração, beijos lascivos da intolerância.

Não sou religioso, porém sou um grande admirador de um homem que foi o maior profeta do amor solidário, da cumplicidade igual, da divindade dos atos humanos dignificados pelo fazer. Esse espetáculo lastimável entristeceu-me muito, pois se muitos os negaram ao longo do tempo, inclusive a Igreja Católica com as suas matanças de infiéis, não esperava isso de um grupo que sempre lutou pela tolerância e pela possibilidade de amar sem preconceitos. Foi um desses momentos que ficamos em dúvida pelo destino da humanidade.

Entretanto, deixando de lado os interesses políticos e econômicos do grupos que patrocinam tais atos, os ataques às diversas imagens de Maria, (as estátuas preferenciais dos evangélicos e homossexuais) podem oferecer um curioso perfil psicológico. Esse ódio a Maria, por parte dos evangélicos machistas, talvez explique-se pela pressão da persona feminina, que sempre lhe foi negado o direito à palavra no centro de facilitação do ego, em ocupar um local privilegiado de domínio. Em outras palavras, aqueles desejos secretos homossexuais que atormentam os pobres machistas e que os fazem resistir com violência desmedida. Não é sem propósito que são tão violentos e agressivos com homens que ostentam comportamentos femininos, pois ao contrário da imagem que querem passar, no fundo, eles temem a mulher, sentem a sua superioridade, ficam eternamente apavorados com a compulsão inconsciente dela. Para compensar essa tortura invasora, dizem que seus órgãos sexuais são cacetes, canhões, armas que tentam matar a mulher simbólica. Por isso eles cerram os dentes, gritam, ameaçam  e mesmo que a agridam até a morte, ela não morre, pois sua alma se instala no seu assassino. O que pode parecer como um ato de força e poder, na realidade não passa de um grito de pavor à invasão da mulher reprimida, pois o machismo é a negação do macho e a afirmação inconsciente da mulher.   Se a voz do povo é a voz de Deus, a sabedoria popular constata que esses temíveis machistas "para rebolar basta um um sopro".

Entretanto, se a mulher já está confortavelmente instalada no centro de facilitação do Ego do homossexual, exercendo um completo domínio autoritário, como se explica esse comportamento agressivo para com as mulheres, simbolizada nessa Passeata com a destruição raivosa da imagem de Maria? É simplório dizer que a mulher é a maior inimiga da mulher, portanto, deve haver uma explicação filosoficamente mais apropriada.

Arrisco uma hipótese que não tem a pretensão à verdade, mas que pode ser um bom material para a reflexão. Quando não temos certeza do que verdadeiramente somos, tememos estar confrontados com a imagem real daquilo que pensamos ser. Por mais que a persona feminina esteja exercendo forte domínio, ela é apenas uma, entre muitas que existem no imaginário, sendo importante para a vivência das fantasias, para indicar a multiplicidade do mundo, mas nunca para exercer um domínio monopolístico do Ego. Aliás, nenhuma persona deve exercê-lo, pois esse local é sempre vazio, de tráfego para todas as personas. Assim, é possível entender a angústia inconsciente que causa a  uma pessoa dominada pela persona feminina, quando confrontado com uma verdadeira mulher. Se fosse a vivência de uma fantasia, vir-se-ia espelhado na imagem da mulher, gerando uma imensa satisfação nessa miragem, elevando a mulher como centro de admiração e respeito. Entretanto, se essa vivência for incrustada no Real, esse confronto gera ódios e em casos mais graves, uma profunda psicose.

 Apesar de não ser afeito à psicanálise, reconheço a importância de citar  aquele que foi considerado o mais brilhante e controvertido pensador dessa vertente psicológica. Lacan referia-se ao Real como um não-todo, local de inúmeras multiplicidades de verdades não-verdadeiras do plano simbólico, local onde reside os imensos mistérios femininos, fora do alcance do simbólico, mas que pode ser sonhado pelo imaginário. Portanto, rapazes "alegres", deixem de pretensões e contentem-se com as fantasias do imaginário, exercendo suas escolhas frente a outras personas, fincando os pés no "querer ser", pois o "pensar que já é", é adentrar no pantanoso campo do Real, com consequências imprevistas e violentas. Não adianta quebrarem a imagem de Maria, pois nunca serão mulheres!

Ivan Bezerra de Sant Anna 





Publicado no site http://www.facebook.com/ibezerra52; http://ibezerra.xpg.com.br e no Blog http://terradonunca-ibezerra.blogspot.com/




segunda-feira, 1 de junho de 2015

Não somos corruptos; somos sabidos



Não somos corruptos; somos sabidos.

A corrupção da merenda escolar em Sergipe é um a mais que existem no seio da sociedade brasileira. A desonestidade está entranhada no tecido social e faz parte das chamadas "práticas normais" de competição para a sobrevivência econômica. É o "salve-se quem puder", elemento motor do maior grau de individualismo possessivo capitalista. Com poucas exceções, a corrupção só é um mal para os que não estão no esquema, pois em dias atuais, essa prática foi rebatizada com adjetivos mais palatável, tais como, sabedoria, inteligência e outros sinônimos.

Querem um exemplo da normalização da corrupção? No prédio em que moro, foi constatada irregularidades administrativas, com superfaturamento, obras inexistentes e pagamentos para um certo serviço de um advogado, que a síndica sacou no caixa em seu nome. Fui nomeado pela assembleia sub-sindico, com a missão de analizar as irregularidades para a feitura de um relatório. Assim o fiz, apresentando um relatório apontando as irregularidades, sugerindo a rejeição das contas e a impetração de uma ação judicial de prestação de contas. A Assembleia rejeitou as contas da antiga síndica e autorizou a prestação judicial. Que aconteceu depois? A nova síndica nunca entrou com a ação de prestação de contas, alegando que a empresa que administra o condomínio, não queria! Não se espantem! Quando terminou o seu mandato, houve uma eleição e adivinhem quem ganhou? Uma chapa comandada por uma lobista de uma grande empresa de administração de Condomínios, sendo os integrantes ligados à antiga síndica que teve as contas rejeitadas. Essa empresa de serviços condominiais foi a mesma que os seu advogado tinha fornecido recibos falsos para que a síndica sacasse os cheques no caixa. Coitado do meu prédio que tem um nome de um grande compositor! Relatei esse caso, como exemplo de uma pequena fotografia da corrupção de um cenário grandioso.

O caso da corrupção da merenda escolar é um pequeno caso, um pontinho no quadro negro da corrupção. O controle das licitações na construção civil é muito antigo e jamais se faz uma obra sem a escolha da Irmandade do tijolo. Na saúde, foi montada uma nefasta quadrilha que não só superfaturava, mas não entregava os medicamentos. Ela acabou? Claro que não, basta ver a quantidades de processos contra o Sr. Rogério Carvalho, que ostenta altos índices de sinais de enriquecimento.

Para que serve o Tribunal de Contas, alguém pode me dizer? Segundo algumas pessoas muito críticas, para carimbar a corrupção, como dizia no passado, o Sr. Jackson Barreto, quando chamava-o de "Tribunal do Faz de Conta". Ora, o mínimo que esse "Tribunal", com uma enorme e grandiosa  estrutura de inúmeros peritos e técnicos deveria fazer  era comparar as propostas com os preços de mercado para descobrir os casos de preços adulterados. E mais: deveria fiscalizar as execuções das obras e dos serviços, pois com essa prática de não entregar produtos ou entregá-los parcialmente, efetuar obras de baixa qualidade, é uma das maneiras disfarçadas de aumentar os ganhos desonestos.

São Cristóvão foi mais uma vez o cenário exemplificativo das práticas de corrupção, no entanto, é apenas um pequeno exemplo que existe em nosso País. Coitada da nossa cidade histórica! Prostituição, corrupção se irmanam para o controle das instituições, inclusive do Judiciário. É famoso o caso de uma poderosa cafetina que oferece suas meninas para membros do Judiciário, MP e Tribunal de Contas, e com isso, monta um verdadeira empresa de troca de favores. As pessoas falam isso, o que pode ser comprovado pelo escândalo dos Precatórios, onde essa senhora e seus cúmplices compravam precatórios por preços baixos, colocava em nomes da suas meninas, e conseguia subverter a ordem de pagamento junto à diretoria de Precatórios do TJ. Sem falar nas reavaliações das dívidas, que faziam que um precatório de R$ 50.000,00 tivesse um valor final de R$ 1.000.000,00! O que o TJ apurou desse escândalo? Nada! E a OAB como se posicionou? Ela nem soube... KKKK E como eu sei? Muita gente sabe, inclusive as meninas da Cafetina e alguns funcionários do TJ.

Nesse estado de coisas, ainda existe alguém ingênuo que acredite que pode mudar com essas eleições compradas e fraudulentas? E a piada da reforma política da OAB, alguém acredita?

Enquanto isso, de maneira sorrateira, entra cada vez mais imigrantes do Haiti e da África, coincidindo com uma grande aumento de armas militares contrabandeadas pela fronteira. Mera coincidência? O futuro dirá.


sexta-feira, 15 de maio de 2015

Blues

Um blues expressivo, sem filigranas, baseado na expressão profunda de uma nota que antecede a outra, movidas por dedos firmes e ágeis que acariciavam as cordas da sua Gibson.

B B King e o blues, formou um casal indissolúvel que "nem a morte separa". Aliás, nesse momento, ela o homenageia com o toque da finitude, o limite que abre as portas da transcendência, uma tensão dialética sempre vivida, mas pouco compreendida. Como um músico mágico, King sabia que todos os dias, morria e renascia, retornava para encarar a dor imemorial e reescrevia em notas em revoadas, os sons promessas do crepúsculo rubro. Não é essa a magia do blues, um banzo soprado da África, a dor da saudade, pontuada pelo impulso mágico da vida clorofila, do "verde que te quero verde"?

Um bom caminho, camarada.


sábado, 18 de abril de 2015

Terceirização: verdade e mito

Terceirização: verdade e mito 




Depois de alguns anos dormindo em alguma gaveta no Congresso Nacional, a população brasileira foi supreendida com a notícia que o projeto lei nº. 4.330 que disciplina o processo de terceirização, tinha sido aprovado pela Câmara de Deputados, inclusive com votos da bancada petista. Se é compreensível que a bancada empresarial, aproveitando-se da fragilidade da Presidente da República, percebeu que era o momento propício para aprovar o referido projeto, não ficou muito claro, entretanto, a participação da maioria da bancada petista nesse episódio. Não porque os ilustres deputados petistas sejam rígidos socialistas, mas porque fizeram de maneira fugidia, à revelia das centrais sindicais.  Aliás, a orientação ideológica que guia o lulismo, não passa de um aglomerado de ideias neoliberais, adoçado por um populismo clientelista, tão a gosto do nosso capitalismo tupiniquim. Quando foi Presidente, o Sr. Lula foi flagrado várias vezes usando o termo "empregalidade", palavra chave, a pérola preciosa do neoliberalismo, usada para explicar e justificar a mobilidade dos empregos, ficando as velhas promessas petistas de estabilidade relativa, o fim da denúncia vazia, relegadas ao lixo da história.

Ora, se o PT e aliados foram os maiores terceirizadores do setor público (a Petrobras é um bom exemplo), desmobilizou o Ministério do Trabalho na sua função fiscalizadora (nunca mais se ouviu falar em concurso para fiscal do trabalho), não extinguiu a denúncia vazia, os deputados petistas votaram no projeto, por que então essa explosão de indignação da Presidente e sua tropa de choque na net e na grande mídia? Contradições, confusões, conflitos no seio petista? Não! Apenas uma hábil e astuta movimentação estratégica que visou dividir, assustar a "reacionária classe média" (palavras bovinas da profa. Marilena Chauí) com a bandeira da extinção gradual do concurso público. Enquanto os planejadores lulistas jogavam com desenvoltura em um tabuleiro de Xadrez, a Direita tradicional e os empresários gananciosos jogavam acanhados em um tabuleiro de Damas. Quanta incompetência!

Já há algum tempo que os estrategistas lulistas tocavam o monótono acorde, enfatizando o caráter reacionário da "classe média", uma afirmação totalmente pragmática, sem nenhum embasamento histórico e científico, mas que iria ser de grande utilidade para os manipuladores petistas. Eles sempre souberam que os extratos médios sociais brasileiros não eram reacionários, mesmo porque tinham sido a base do petismo de outrora e de onde saíram os seus principais líderes e intelectuais. Sabiam que os extratos médios eram confusos e contraditórios - uma característica sociológica de todos os extratos médios do mundo - e essas características seriam valiosa para os seus propósitos, acrescida pela cultura autoritária que permeia os valores culturais brasileiros, quanto à intolerância aos novos e velhos valores e a divergência de ideias e opiniões. Assim, era só esperar que o bloco carnavalesco das múmias paralíticas do Olavo de Carvalho entrasse na avenida, cortejado pelos homofóbicos, liderados por Bolsonaro; cartazes estupidos pedindo a intervenção militar; corruptos conhecidos vociferando contra a corrupção; e estava montado o palco para a desmobilização política da terrível "classe média". Faltava, porém, mais um lance, e com o estímulo de alguns deputados petistas, a avarenta bancada empresarial e a incompetente oposição, deram: a aprovação furtiva do projeto de lei da terceirização! As pessoas, que até então estavam indignadas com a lama da corrupção petista, perplexas, angustiadas, se perguntavam: "Meu Deus, e os empregos, os concursos públicos, como vai ficar tudo isso?" Nesse momento, coloca-se a pedra chave no tabuleiro: "Mamãe Dilma está com vocês. Ela vai vetar a famigerada lei. A culpa disso tudo é do PSDB e aliados".

A Direita tradicional e a extrema Direita do Sr. Olavo Carvalho precisam aprender o novo jogo do neoliberalismo populista, uma nova orientação de direita que o PT é o seu mais digno representante. Por que esse retrógrado anticomunismo, quando se pode auferir grandes lucros pessoais com empréstimos aos países que têm orientação de Esquerda? Ou será que existe alguém ingênuo, ao ponto de acreditar que Lula não levou a sua gorda comissão desses empréstimos? Enquanto o Sr. Olavo de Carvalho e seus "camisas pardas" chamam Lula e seu bando de comunistas "comedores de criancinhas", os lulistas vestem camisas vermelhas e distribuem bolsas "disso e daquilo", enquanto ajudam as grandes empresas e Bancos, auferindo grandes recompensas financeiras. Os seguidores do Bolsonaro e do Olavo ainda não perceberam que o socialismo em nosso País se encontra nas bibliotecas, sob a guarda de poucos intelectuais resistentes, e essa constatação não é recente, pois, certa vez, Carlos Drummond de Andrade, acometido pela descrença, declarou que a única Esquerda organizada era a Associação dos Canhotos Paulistas. Essa turba vestida de camisas rubras, quando não são torcedores do Sergipe, são apenas uma massa de manobra de salafrários, pilantras e corruptos que em nome de uma pluralidade de demandas, dizem que tudo é relativo, manobrando os conceitos, moldando-os segundo seus interesses, criando polos artificiais para a manipulação maniqueísta, e se existe uma realidade objetiva, essa deve ser negada em nome do pluralismo e substituída por sonhos e atitudes performáticas. O Sr. Olavo de Carvalho, mesmo cercado de tantos livros, não percebeu que no pósmodernismo da era petista, tudo existe e nada existe, tudo que é sólido se desmancha na podridão do ar rarefeito, nada é verdade e tudo é Capital insinuantemente dominante, e somente existe uma verdade: não existe verdade! Imaginem, senhores dogmáticos de um passado tenebroso, que estamos no Brasil - "em uma terra que em se plantando tudo dá", como já disse Pero Vaz de Caminha - e aqui não se aplica o famoso dilema existencial do "to be or not to be", mas a versão esquizofrênica do "to be and not to be", o que o nosso atual filosofo brasileiro, aquele que tem um busto perto da Casa Branca, poderá dizer: "nois é e não é, e o que digo, seremos!" Assim, caro professor, cores e camisas são apenas coisas que servem para enfeitar e enganar, e se deseja ter alguma credibilidade, deixe de jogar damas e vá a um tabuleiro de xadrez.

E o nosso tão discutido projeto legislativo da terceirização? Ora, em um País onde as empresas estão altamente terceirizadas, essa "pressa" dos seus defensores somente é justificada pela ganância em relação aos futuros e rentáveis negócios com as empresas estatais. No entanto, acho que deve haver uma lei que normatize o processo de terceirização, mas de uma forma sorrateira e pretensamente astuta, não seria uma boa solução democrática. O resultado dessa pretensa inteligência estratégica foi trágica: a mamãe Dilma virou salvadora da "classe média" concurseira! Não me canso de repetir: quanta burrice! E como não se espera burrice dos espertos, segundo o saudoso Raimundo Faoro, burrice demais pode esconder a astúcia disfarçada. Coisas de um Brasil macunaímico, a terra onde todos gatos são pardos.

É difícil dar lucidez a um empresário, pois seus objetivos competitivos são a curtíssimo prazo, e como já observou Karl Marx em páginas belíssimas de O Capital, o próprio empresário perde a dimensão do valor de uso, alienando-se nas teias do valor de troca, em obediência ao Deus ex-machine, o Capital que cumpre a sua interminável sina de se reproduzir em ciclos eternos. Em seu individualismo possessivo e competitivo, não percebem que estão destruindo os elementos basilares do capitalismo e, muitas vezes, torna-se necessário o aparecimento de uma grande crise econômica, acompanhada pelo crescimento de uma verdadeira esquerda, para haver reformas que induzam um novo ciclo de crescimento. A era Roosevelt é um exemplo do que afirmamos, tendo o Estado assumido a tarefa de administrar e fazer reformas profundas que debelassem a crise, apesar da ampla resistência do empresariado. 

Atualmente, depois da enorme crise financeira de 2008, constatou-se que a avidez do capital financeiro produziu inúmeras fraudes, com a única finalidade de auferir enormes ganhos, e quando o sistema desabou, foi o dinheiro do contribuinte que irrigou os cofres dessas empresas desonestas e incompetentes. Pergunta-se: onde se encontra a famosa eficácia do Capital? Percebe-se que os grandes capitalistas industriais e manufatureiros vivem com o dinheiro público, enquanto o capital financeiro vive de especulação, fluindo para os lugares que lhe seja propiciado grande rentabilidade. Nesse cenário, a terceirização internacional está destruindo empregos, desmobilizando o parque produtivo dos países industrializados, inclusive nos EUA. Se a terceirização visa tão somente a redução de custo, em consequência da especialização e economia de escala da terceirizada, tudo bem, mas que isso não se traduza na redução de empregos ou na precarização dos ganhos trabalhistas. 

Entretanto, o que se vê é uma enorme avidez por maiores lucros do Capital, precarizando as conquistas trabalhistas e reduzindo as vagas de empregos. Pergunta-se: se continuar o crescente desemprego, a consequente redução da renda disponível para o consumo, quem vai comprar os serviços e produtos das empresas? Será necessário o Estado gerar esses empregos ou bolsas para irrigar a economia, e se essa for a solução, como financiará essas despesas, uma vez que o empresariado é fortemente contra ao aumento de impostos? Claro que a solução do Lulismo jamais vai ser aceita por países de economia avançada, pois baseia-se em um crescimento astronômico da dívida pública (a dívida interna beira já ao R$ 2,4 trilhões!) o que mais dia ou menos dia, a falência pública será declarada.

E o que fazer? Essa velha indagação leninista somente poderá ser respondida em um verdadeira República, com os canais de comunicações democráticos desobstruídos, através de um amplo diálogo que perpasse os interesses mesquinhos, um projeto de desenvolvimento nacional que envolva empresários e trabalhadores, despidos do populismo dos enganadores, que almejam um acordo sempre precário, mas sempre rediscutido e renovado. 

Mas tudo isso é um sonho, um desejo, uma prece. Moramos em uma falsa República, permeada por ambições, mentiras e engodos. Enquanto todas as atenções estavam voltadas para o obscuro PL 4.330, o STF, na surdina da noite, julgava constitucional a lei nº 9.737/98, sancionada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, que autoriza a Administração Publica repassar a gestão das escolas públicas, universidades estatais, hospitais, unidades de saúde, museus, fundações, empresas públicas, para entidades privadas sem fins lucrativos, tais como Ongs e Organizações Sociais. Existe algo mais nocivo para a moralidade pública e para o instituto do concurso público? O mais interessante é que os Ministros considerados fiéis ao lulismo, votaram na constitucionalidade da referida lei, o que é uma constatação realmente estranha. O que a Presidente vai fazer, já que a digna mandatária é contrária à terceirização? E a CUT, como se manifestará? Ou será mais um jogo de cena, uma pérfida manipulação, sendo o PL  4.330 apenas um falso alvo para desviar os olhares da população, enquanto o STF "aprovava" e presenteava o lulismo com um maravilhoso instrumento de aparelhamento e corrupção da Administração Pública?      

Com a palavra, a excelentíssima Presidente da República...

Ivan Bezerra de Sant' Anna



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